Indiciamento de Bolsonaro inaugura nova etapa em processo que deve se arrastar para 2025

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O indiciamento pela Polícia Federal de Jair Bolsonaro (PL), Braga Netto e ex-assessores é, sem dúvida, um fato político e jurídico relevante, mas representa apenas uma etapa inicial no processo que agora começa a tomar forma. Não há surpresa no indiciamento dessas figuras, considerando que o Supremo Tribunal Federal (STF), a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a Polícia Federal não conduziriam uma investigação dessa magnitude sem buscar a responsabilização de quem é considerado mandante ou beneficiário dos atos de 8 de janeiro, políticos ou não.

A entrega do relatório final da Polícia Federal marca um ponto importante no calendário porque é a partir dele que o Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, começará a preparar a denúncia que será oferecida ao Supremo. Uma vez apresentada e recebida, a denúncia se transformará em uma ação penal, tornando Bolsonaro réu no STF — algo já amplamente esperado e que deve ocorrer apenas no próximo ano.

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Há duas razões principais para que a denúncia fique para 2025. Primeiro, a demora na conclusão das investigações pela Polícia Federal, que só agora remeteu o relatório final. Segundo, o Procurador-Geral evita oferecer a denúncia ainda este ano, pois seria impossível que o Supremo a julgasse até dezembro. Isso abriria espaço para ataques dos apoiadores de Bolsonaro e do próprio ex-presidente, enfraquecendo o impacto da denúncia. Assim, estrategicamente, Gonet deve deixar a apresentação para fevereiro, quando o STF poderá analisar os argumentos jurídicos com maior atenção.

O julgamento, quando ocorrer, será conduzido pela Primeira Turma do STF, composta por Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Cristiano Zanin. Bolsonaro enfrentará uma disputa jurídica extremamente difícil, dada a gravidade dos fatos e os indícios já levantados. Porém, ele também adotará uma estratégia extrajurídica — narrativa e política —, algo que não é novidade. Em situações de investigações robustas e indícios significativos, investigados frequentemente recorrem a táticas de desqualificação dos investigadores e julgadores.

Bolsonaro já iniciou essa estratégia ao atacar a Polícia Federal, acusando-a de agir sob influência de Alexandre de Moraes, considerado o principal alvo de sua retórica. Ele também deverá mirar Paulo Gonet, alegando parcialidade do Ministério Público. Essa abordagem é semelhante ao que ocorreu em casos como o Mensalão, em que réus adotaram uma narrativa de perseguição jurídica e política.

Bolsonaro tem, contudo, algumas vantagens no campo narrativo. Ele já construiu ao longo dos anos uma base que o enxerga como vítima de perseguição, com forte capilaridade nas redes sociais e entre seus apoiadores. Além disso, esta investigação apresenta características inovadoras, sendo conduzida diretamente pelo Supremo, com Alexandre de Moraes escolhido como relator. Isso fornece material para que ele questione a origem do processo e alimente sua narrativa de perseguição.

No campo jurídico, porém, a realidade é outra. A denúncia deve ser recebida pela Primeira Turma, tornando Bolsonaro réu e iniciando um longo processo de defesa e julgamento. Embora o tempo para a conclusão do caso seja incerto, é provável que o processo avance de forma mais célere, dado o formato de julgamento na Primeira Turma. Mesmo assim, prazos processuais e procedimentos garantem que a tramitação não será tão rápida quanto o tribunal ou o governo poderiam desejar.

Outro fator relevante é a composição da Primeira Turma, formada por ministros indicados por Lula, Dilma ou Temer, o que deve ser explorado por Bolsonaro para sustentar sua narrativa de parcialidade. Alexandre de Moraes, visto como seu maior adversário, divide o colegiado com Fux, indicado por Dilma; Zanin, advogado de Lula na Lava Jato e indicado por ele; Dino, ex-ministro de Lula; e Cármen Lúcia, também indicada por Lula. Esse contexto político será peça-chave na estratégia de Bolsonaro.

Por fim, embora o indiciamento tenha relevância política e jurídica, pode parecer insuficiente, para alguns, como base para uma condenação definitiva. Contudo, é importante lembrar que o trabalho da Polícia Federal é apenas a etapa inicial do processo. Ainda há investigações em curso, e cabe ao Ministério Público apresentar a denúncia, podendo incluir novos indícios e provas que tornem mais contundente o envolvimento de Bolsonaro e seus assessores nos atos de 8 de janeiro. Se ele será condenado ou não, só o tempo dirá, mas o país deve passar os próximos dois anos acompanhando essa investigação e o andamento da ação penal.

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