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Lei que altera Renovabio agrada produtores, mas multa acende alerta para judicialização

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A sanção da lei que altera a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) para incluir ganhos aos produtores independentes com a negociação de créditos de descarbonização (CBIOs) foi celebrada pelos produtores de cana-de-açúcar. O pleito era defendido pela categoria desde as discussões do projeto de lei que instituiu a política, sancionada em 2017. Mas o novo regramento causou reação oposta dos distribuidores de biocombustíveis. A nova regra (Lei 15.082), sancionada em dezembro, também endurece as penas para o setor em caso de descumprimento das metas de descarbonização, com tipificação como crime ambiental e teto de multas em R$ 500 milhões. A categoria deve intensificar a  contestação da obrigatoriedade de adquirir os créditos na justiça.

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Os créditos de descarbonização têm papel central no Renovabio. Os CBIOs são instrumentos financeiros para o incentivo à redução de emissões no setor de combustíveis. O programa estabelece que eles sejam emitidos por usinas certificadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Às distribuidoras há a obrigação da compra de CBIOs na proporção de combustíveis fósseis comercializados no ano anterior.

Negociado na bolsa, cada papel corresponde a uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) que deixa de ir para a atmosfera pelo uso de biocombustíveis.  Desde a implementação integral da política, em 2020, cerca de 160 milhões de toneladas de CO2 deixaram de ser emitidas, segundo monitoramento da ANP.

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A sanção da nova lei, segundo o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, “deixa bem claro” o compromisso do governo Lula (PT) com o programa e com a redução das emissões de gases causadores do efeito estufa. Para o governo, as novas normas aprimoram o marco regulatório do setor. A lei, segundo o chefe da pasta a qual a ANP está vinculada, valoriza o papel dos produtores de biomassa e pune com maior rigor os que descumprem os seus deveres.

Uma das principais mudanças é o fim da exclusividade das usinas nos ganhos obtidos com a negociação de créditos de descarbonização. Com a Lei 15.082, os produtores de cana-de-açúcar independentes deverão receber parcelas de, no mínimo, 60% das receitas provenientes da comercialização dos CBIOs — nos casos em que o combustível é gerado a partir do processamento da cana entregue por eles às usinas.

Além do percentual, quando fornecer à indústria os dados primários necessários para o cálculo da nota de eficiência energético-ambiental, o produtor também deverá receber 85% da receita adicional sobre a diferença de créditos, já descontados os custos de emissão.

Na lei que instituiu o Renovabio, havia a previsão de repasse dos ganhos por acordo entre produtores e usinas, mas representantes do setor afirmam que essa não era a norma. “Entendemos que é na cana, no processo de descarbonização, que acontece a captura do carbono. É no processo de fotossíntese, que vem bem antes do etanol. Então o produtor precisa ser incluído nesse ganho”, afirma o CEO da Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil (Orplana), José Guilherme Nogueira. Os produtores independentes representam de 30% a 40% da produção de cana no país, de acordo com ele. As novas regras devem abranger cerca de 80 mil produtores.

O avanço da lei demandou a “pressão organizada do setor”, segundo o presidente da Federação dos Plantadores de Cana do Brasil (Feplana), Paulo Sergio Leal. Quando o Renovabio foi sancionado, o governo de Michel Temer (MDB), presidente à época, prometeu que logo um projeto de autoria do executivo seria enviado ao Congresso para a inclusão de percentuais de ganhos para os produtores. Mas os produtores afirmam que a discussão só teve seguimento no Legislativo depois da articulação do setor com parlamentares, outras entidades e a indústria sucroalcooleira.

Embora tenham alcançado a reivindicação de quase 10 anos, os produtores ainda não estão plenamente satisfeitos. O setor queria garantir o recebimento de 80% dos ganhos dos CBIOs na lei. “Nós chegamos a esse número considerando todo o processo de descarbonização, que a cana é do produtor e também que a fase agrícola representa a maior parte do processo”, diz Nogueira, da Orplana. Os 60% foram considerados como um meio termo da negociação com a indústria, que defendia que o repasse ficasse entre 40% e 50%.

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A lei também prevê o repasse para produtores das demais matérias-primas de biocombustíveis, como soja e milho. Nesses casos, não há percentuais estipulados. As parcelas deverão ser negociadas no âmbito privado.

Para o advogado Luiz Gustavo Bezerra, que lidera a área de ESG do escritório Tauil & Chequer no Brasil, faz sentido que uma primeira normativa voltada ao ganho dos produtores traga especificidades ao setor da cana-de-açúcar. O etanol corresponde a 84% do lastro de emissão total de CBIOs até agora, segundo a ANP.

“Grande parte das discussões vêm da cana. Pela lógica, faz sentido regular primeiro a matéria-prima mais estabelecida. As outras (matérias-primas) envolvem discussões mais complexos, é mais difícil de alcançar os percentuais”, afirma.

A previsão legal também possibilita que o produtor de cana-de-açúcar abra mão do seu direito de participação nos valores da negociação dos CBIOs, de forma gratuita ou não, mediante um contrato.

“O produtor pode fazer isso de forma integral a depender da relação comercial a ser estabelecida com a usina”, explica o advogado tributarista Pedro Guimarães, sócio do escritório Andrade Maia. Essa decisão pode ser influenciada pela alta volatilidade dos créditos. “Como o valor dos CBIOs é variável, em um momento em que ele esteja numa escalada alta, alguns produtores podem preferir receber um adiantamento com base nisso e abrir mão do direito de participação depois”, diz.

Multa pode ser cem vezes mais cara

O valor máximo da multa para as distribuidoras, em caso de descumprimento da obrigação de compra dos CBIOs emitidos pelas usinas de biocombustíveis, é cem vezes maior. Antes da nova lei, o teto era de R$ 5 milhões. Agora, a quantia a ser paga pode variar de R$ 100 mil a R$ 500 milhões. Para advogada Maria Hortência Nascimento, que acompanhou a Associação Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis (ANDC) durante a tramitação do projeto no Congresso, a mudança traz “impactos abusivos” para somente uma parte da cadeia.

Segundo ela, a nova lei “espalha terror no segmento de distribuição de combustíveis” e traz insegurança jurídica. “Certamente resultará no aumento do custo regulatório da atividade econômica, com repercussão no aumento dos processos de judicialização do RenovaBio”, afirma.

O não cumprimento das metas de descarbonização também passa a ser tipificado como crime ambiental e distribuidores inadimplentes com sua meta individual podem ser proibidos de comercializar combustíveis ou ainda terem revogada a autorização dada pela ANP.

A advogada também diz que não houve diálogo com os distribuidores durante a tramitação do projeto de lei no Congresso e que o aumento foi um “jabuti” inserido por congressistas, sem relação com a intenção inicial do projeto de lei.

Segundo ela, o processo se deu “desconsiderando completamente o rito democrático e da técnica legística” e sem transparência e discussão pública com os interessados e os consumidores. “Resultou numa norma frankenstein”, afirma. A associação considera a possibilidade de levar a questão ao Supremo Tribunal Federal (STF) por agressão à ordem econômica.

Com a ampliação da pena, a tendência é que as distribuidoras intensifiquem a demanda pela desobrigação da compensação de emissões por meio da compra dos créditos. A imposição do Renovabio é questionada em ação no STF. Em 2024, o PRD ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a previsão do programa que estabelece a obrigação a apenas essa parte da cadeia.

“Há várias distribuidoras já discutindo sobre esse grau de intervenção da União e algumas têm tido decisões favoráveis para que elas não sejam obrigadas a fazer a aquisição de CBIOs”, afirma o advogado Pedro Guimarães.

“Esse deve ser mais um argumento para as distribuidoras dizerem que está havendo uma violação da livre iniciativa e um avanço forte do Estado em relação a esse mercado”, diz.

O setor também critica o valor máximo da multa ser superior ao estabelecido para infrações ambientais. O teto para as multas ambientais é de R$ 50 milhões, conforme decreto do governo federal de 2008. Para o advogado Luiz Gustavo Bezerra, a multa determinada pela lei que altera o Renovabio é coerente para o momento atual. “Na verdade, são os R$ 50 milhões do decreto de multas ambientais, que foi estabelecido há 16 anos, que não foram atualizados. É preciso olhar com essa lógica de que os R$500 milhões da lei são o parâmetro de uma legislação mais moderna”, diz.

Bezerra também considera que a multa é proporcional à quantidade dos créditos que não foram adquiridos para compensar as emissões dos gases de efeito estufa. “Pode assustar à princípio, mas traz um grau de proporcionalidade que me parece em linha com o que a Constituição estabelece”, afirma. “O R$ 500 milhões são um teto, mas o valor pode ser graduado de acordo com o valor médio dos CBIOs que deixaram de ser aposentados”, diz.

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