Magistrados vão à Justiça contra concurso do TJSP só para mulheres

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Um grupo de vinte magistrados homens de São Paulo impetrou um mandado de segurança questionando o edital 2/24 do Conselho Superior da Magistratura (CSM) do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que instituiu a abertura de um concurso destinado somente a mulheres para o cargo de desembargadora.

“O ato concreto está ferindo direito líquido e certo de cada impetrante, uma vez que pelo fato de ser do gênero masculino, está alijado do concurso de promoção, e impedido de exercer o que lhe assegura a Lei Orgânica da Magistratura e a própria Constituição Federal”, escrevem na petição inicial os advogados Samuel Alves de Melo Júnior e José Roberto Machado, do escritório Marçal Alves de Melo Advogados Associados, que representa o grupo.

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Eles pedem a concessão da liminar para suspender o andamento do concurso até o julgamento do mandado de segurança, argumentando que há “risco de dano irreparável”. Depois, eles pedem que o concurso seja anulado e que outro edital seja publicado, garantindo aos magistrados o direito de se inscrever e concorrer à vaga aberta.

Para o grupo, o edital voltado exclusivamente para mulheres fere o princípio da isonomia e não se justifica como medida de compensação, já que, no seu entendimento, nunca houve política semelhante voltado ao gênero masculino. “Se abriu o concurso apenas para mulheres porque se quis beneficiá-las em detrimento dos Juízes homens”, diz trecho do documento impetrado no último dia 25.

Na petição, os advogados dos magistrados ressaltam que eles não estão “fazendo qualquer censura ao movimento político e social que busca a garantia e efetividade dos direitos e das oportunidades às mulheres”.

Para eles, a diferença no número de mulheres e homens ocupando o cargo mais elevado da carreira se deve apenas à “data em que elas ingressaram na magistratura e a natural demora na abertura de vagas, que atinge a ambos os gêneros de forma igual”.

“O fato de historicamente ter havido desigualdades ou de, eventualmente, outros Tribunais do País tê-las praticado, não se presta para justificar qualquer correção em São Paulo, onde desde 1981, quando as primeiras mulheres foram aprovadas no concurso de ingresso, não existe e não existiu qualquer diferença de tratamento e nunca houve preterição à promoção para o último cargo da carreira”, afirmam.

Os magistrados anexaram um parecer do professor Yves Gandra Martins sobre o tema, destacando um trecho em que ele reconhece que as cotas são permitidas, mas afirma que “atendimento ao critério de igualdade de gênero não pode ser maior que a dignidade que significa o serviço prestado pela sociedade pela magistratura, em âmbito nacional.”

Resolução do CNJ

O concurso do TJSP só para mulheres tem como base a resolução 525/2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Editada em setembro do ano passado, a norma criou uma política de alternância de gênero para as vagas de segunda instância do Judiciário.

Os tribunais que ainda não alcançaram a proporção de 40% a 60% por gênero deverão alternar editais exclusivos para mulheres com editais mistos até o atingimento de paridade de gênero.

Um levantamento realizado em 2023 pelo CNJ mostra que as mulheres, embora constituam cerca de 51% da população brasileira, representam somente 38% da magistratura, sendo 40% no 1º grau e 21,2% no 2º grau.

Os magistrados paulistas que impetraram o mandado de segurança contra o edital do TJSP argumentam que essa resolução do CNJ “contém vícios insanáveis de natureza constitucional”, portanto, o concurso baseado nela não poderia ser mantido.

Para o grupo, como a resolução que instituiu a política afirmativa de gênero tratou de situações não previstas na norma regulamentada, “a conclusão a que se chega é de que o CNJ acabou por inserir novas regras, alheias à sua competência e ferindo ao que dispõe o artigo 93, da CF.”

“Não existe, seja na Carta Maior, seja na Lei Complementar, qualquer dispositivo que justificasse a regulamentação de concurso de promoção apenas para mulheres, como foi adotado pelo Conselho Superior da Magistratura, repetindo-se o que já se afirmou. Não bastassem tais questões, a Constituição assegura, como direito fundamental, que todos são iguais perante a lei”, completa.

Movimento Nacional pela Paridade no Judiciário

Após tomar ciência do mandado de segurança impetrado pelos magistrados, o Movimento Nacional pela Paridade no Judiciário emitiu uma nota reforçando a necessidade de implementação de ações afirmativas voltadas à promoção da participação feminina no segundo grau.

A nota afirma que pesquisas citadas no voto condutor da resolução CNJ 525/23 demonstraram a sub-representação de mulheres em tribunais brasileiros e indicaram que “a simples passagem do tempo não está sendo e nem será suficiente para alterar esse grave quadro. Prova disso é que em mais de 40 anos, o número de desembargadoras no Brasil aumentou de 21% para 25%, ou seja, menos de 1% a cada 10 anos”.

No texto, o Movimento Nacional pela Paridade no Judiciário também afirmou que defende o acesso à justiça e direito de petição como direitos fundamentais, mas reforça que o edital em questão “cumpre os ditames constitucionais de garantir a igualdade para todos” e relembra que “igualdade não é tratar todos da mesma maneira, mas sim tratar todos e todas na medida das suas desigualdades”.

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