Marco Civil da Internet e liberdade de expressão

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A Lei Federal 12.965, de 23 de abril de 2014, estabelece princípios, garantias, direitos e deveres par o uso da internet no Brasil e determina as diretrizes para atuação da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios em relação à matéria (art. 1º).

O artigo 2º da Lei 12.965/2014 traz expressamente que “a disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão”.

A Constituição Federal de 1988 protege expressamente a liberdade de expressão, a liberdade de informação, de imprensa e a manifestação do pensamento – intelectual, artístico, científico etc.

Como muito bem delineado pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, “as liberdades de expressão, informação e imprensa são pressupostos para o funcionamento dos regimes democráticos, que dependem da existência de um mercado de livre circulação de fatos, ideias e opiniões. Existe interesse público no seu exercício, independentemente da qualidade do conteúdo que esteja sendo veiculado. Por essa razão, elas são tratadas como liberdades preferenciais em diferentes partes do mundo, em um bom paradigma a ser seguido”.[1]

E ainda, na mesma decisão, o ministro Barroso faz menção à decisão do STF na ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 130, que teve a relatoria do ministro Ayres Britto[2], de onde se extrai:

“(…) Logo, não cabe ao Estado, por qualquer dos seus órgãos, definir previamente o que pode ou o que não pode ser dito por indivíduos e jornalistas”.

E mais, do que se extrai do acórdão da ADPF 130 da Suprema Corte: 

“(…) Ou, nas palavras do Ministro Celso de Mello, ‘a censura governamental, emanada de qualquer um dos três Poderes, é a expressão odiosa da face autoritária do poder público’.”

A liberdade de expressão é um princípio basilar do Estado democrático de Direito. A jurisprudência da Suprema Corte é firme quanto a questão da liberdade de expressão e do pensamento:

“(…) A liberdade de expressão constitui-se em direito fundamental do cidadão, envolvendo o pensamento, a exposição de fatos atuais ou históricos e a crítica” (HC 83125, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 16/09/2003, DJ 07-11-2003 PP-00093 EMENT VOL-02131-03 PP-00552).

A Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) trouxe como fundamento o respeito à liberdade de expressão (art. 2º), e como um de seus princípios a garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação pensamento, nos termos da Constituição Federal (art. 3º).

Como disposto no artigo 3º da lei 12.965/2014, a liberdade de expressão, comunicação e manifestação, nos termos da Constituição Federal: “garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição Federal”.

A Constituição Federal de 1988 garante expressamente a liberdade de expressão, mas, como sabemos, há limites previstos na própria Carta Constitucional quando haja colisão com outros princípios e/ou direitos que tenham o mesmo status

Nessa esteira de pensamento o STF já decidiu que é necessário o equilíbrio entre os direitos fundamentais, não podendo a liberdade de expressão ser utilizada para a prática de atos ilícitos (HC 82424).

Ou seja, quando há conflito com outros princípios e/ou direitos que tenham o mesmo status da liberdade de expressão, surgem limites, que estão previstos na própria Constituição Federal.

Questões envolvendo o conflito entre a liberdade de expressão e outros princípios e direitos na Internet têm chegado ao Poder Judiciário, que tem tratado do debate em diversas decisões.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu sobre a questão da retirada de página da rede mundial de computadores entendendo que “se empresa brasileira aufere diversos benefícios quando se apresenta ao mercado de forma tão semelhante a sua controladora americana, deve também, responder pelos riscos de tal conduta” (REsp 1021987/RN, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 07/10/2008, DJe 09/02/2009).

Assim, em breve análise, entendemos que o Marco Civil da Internet trouxe para o ordenamento jurídico pátrio o princípio da neutralidade de rede e reforçou em seu texto o já consagrado constitucionalmente princípio da liberdade de expressão, visando uma liberdade no fluxo de informações e um menor controle estatal.

Como cediço, a liberdade de expressão já é um princípio garantido constitucionalmente, e a lei do Marco Civil da Internet veio reforçar essa ideia, principalmente em razão das novas mídias introduzidas na sociedade moderna com a Internet.

Entendemos que a liberdade de expressão deve ser a mais ampla possível, mas, com a devida observância dos limites constitucionais e legais que lohe são impostas – como mencionado, quando houver conflito com outros princípios e/ou direitos alçados ao mesmo status

Acreditamos que a divulgação da informação, da cultura e do conhecimento devem ser levadas a todos os brasileiros, indistintamente, principalmente pela dimensão continental de nosso país, e, muito mais ainda, pela falta de acesso que muitas comunidades ainda têm para buscar o conhecimento.

Para isso é de fundamental importância a preservação e garantia da neutralidade de rede introduzida pela Lei 12.965/2014 em nosso ordenamento jurídico, bem como o respeito aos princípios de garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento (art. 3º, I, da Lei Federal 12.965/14), além de todos os demais princípios: proteção da privacidade; proteção dos dados pessoais; preservação da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede, por meio de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais e pelo estímulo ao uso de boas práticas; responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades; preservação da natureza participativa da rede; e liberdade dos modelos de negócios promovidos na internet[3].

Os princípios da neutralidade de rede e de garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento introduzidos pelo Marco Civil da Internet são de fundamental importância para os avanços tecnológicos do país, bem como a uma nova cultura de respeito cada vez maior ao princípio constitucional da liberdade de expressão – agora e em escala cada vez maior no universo digital.

Oxalá a neutralidade de rede e a liberdade de expressão auxiliem efetivamente na diminuição do enorme fosso de exclusão digital que ainda existe em nosso país, trazendo mais conhecimento, informação e cultura a todos os cidadãos brasileiros!

[1] STF. Reclamação 18638/CE. Relator: Ministro Luís Roberto Barroso.

[2] “Por maioria, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou que a Lei de Imprensa (Lei nº 5250/67) é incompatível com a atual ordem constitucional (Constituição Federal de 1988). Os ministros Eros Grau, Menezes Direito, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Cezar Peluso e Celso de Mello, além do relator, ministro Carlos Ayres Britto, votaram pela total procedência da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130. Os ministros Joaquim Barbosa, Ellen Gracie e Gilmar Mendes se pronunciaram pela parcial procedência da ação e o ministro Marco Aurélio, pela improcedência” – disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/vernoticiadetalhe.asp?idconteudo=107402

[3] Art. 3º, da Lei Federal 12.965, de 23.04.2014.

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