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Elon Musk, dono do X (ex-Twitter), comporta-se como um garoto de recados da extrema direita global ao ameaçar a Justiça e, portanto, a soberania brasileira quando se recusou a seguir decisões judiciais pertinentes àquela rede social e, na sequência, passou a ameaçar o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Agora, o magnata dublê de empreendedor e suposto paladino da liberdade de expressão é investigado no âmbito do inquérito das fake news.
A movimentação de Musk é bastante conveniente para si, que busca fazer do espaço cibernético uma terra de ninguém para maximizar seus lucros, e para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que busca se livrar da prisão a qualquer custo e manifestou apoio ao dono do X. Diz-se que o patriotismo é o último refúgio de um canalha. No caso de Bolsonaro e a extrema direita, o refúgio reside numa rede transnacional formada por nomes que batem continência para o lema “Deus, pátria, família e liberdade” enquanto buscam liberdade de expressão para praticar desde pequenos crimes até mesmo desafiar instituições democráticas.
A internacional reacionária integrada por Bolsonaro, seus filhos, o ex-presidente e candidato à Casa Branca Donald Trump cai como uma luva para as pretensões político-econômicas de Musk, que em sua rede vive reclamando que supostos esquerdistas cerceiam a liberdade de expressão. O objetivo é emparedar o Estado brasileiro e caracterizá-lo como iliberal, até mesmo ditatorial. A prova cabal disso viria com a suspensão do X no Brasil.
A liberdade de expressão não é um valor absoluto no ordenamento jurídico pátrio. Países europeus detêm um modelo similar. Porém, Musk parece não ter interesse algum em incomodar Alemanha e França, países que têm status maior que o Brasil no cenário internacional. No Brasil, falta, sim, uma maior regulação das redes, mas isso não tira o mérito do trabalho do STF, que tem tido uma atuação técnica no assunto, interpretando a Constituição para aplicá-la em situações que decorrem de tecnologias que surgiram depois de sua promulgação, em 1988.
Musk e a extrema direita já tratam o Brasil como república de bananas ao promover campanhas infames contra a soberania nacional. O patriotismo bolsonarista dura apenas até a primeira ameaça de prisão. Se Trump voltar à Casa Branca nas eleições de novembro, esse tipo de pressão externa só tende a aumentar. O objetivo é desestabilizar não o atual governo, mas a democracia brasileira e seu já limitado império da lei.
Se a extrema direita, tal como Musk, simpática ao nacionalismo branco, empreende uma batalha pela eternidade, a eterna luta dos democratas é sufocar o fascismo sem destruir as garantias individuais. O Brasil encontra-se nesse estágio. A assimetria de poder entre as big techs e os Estados é tamanha que não será surpreendente se nos próximos anos as primeiras ocuparem funções tradicionalmente providas pelos segundos, tais como a emissão de moedas e até mesmo a solução de conflitos.
O espaço virtual, sem território físico, tem o potencial para construir soberanias paralelas. No fundo, é assim que Musk age, como se fosse um Napoleão da era digital, querendo impor à força regras a países. Napoleão ao menos lutava contra o absolutismo do Antigo Regime, implantando reformas modernizantes. Musk aliou-se a e representa um reacionarismo que em última instância quer nos levar ao pré-Iluminismo.
As luzes das quais a democracia precisa não vêm das telas de celular ou computador, mas da lei promulgada conforme as regras da soberania popular. Musk não é revolucionário, mas contrarrevolucionário. O Brasil serve apenas de laboratório para um embate que pode modificar o modo de organização política do mundo em Estados soberanos.