O CNJ e a disciplina judiciária

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O Poder Judiciário possui uma hierarquia institucional prevista no art. 92, da Constituição Federal. No entanto, é importante destacar que, apesar de constar no rol do referido dispositivo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é o único órgão que não possui competência jurisdicional.

Instituído pela Emenda Constitucional 45/2005, o CNJ detém competência administrativa, financeira e correicional em relação a todos os órgãos do Judiciário, excetuando-se apenas do Supremo Tribunal Federal (STF).

A competência disciplinar do CNJ é exercida inicialmente pela Corregedoria Nacional de Justiça em procedimentos específicos, voltados para analisar a existência de indícios de faltas funcionais praticadas por magistrados. São eles: Reclamação Disciplinar, Representação por Excesso de Prazo, Sindicância e Pedido de Providências.

Esses são os procedimentos de entrada para demonstrar eventual conduta indevida e/ou inadequada dos membros da magistratura.

Uma vez constatados elementos que caracterizam o descumprimento dos preceitos estabelecidos na Constituição Federal, na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LC 35/79) e no Código de Ética da Magistratura Nacional (CEMN), o CNJ pode deliberar pela instauração de Processo Administrativo Disciplinar em face do magistrado faltoso.

Recentemente está em discussão a competência do CNJ em relação a magistrados e Tribunais que estão descumprindo decisões de Tribunais Superiores, especialmente quando há Repercussão Geral declarada pelo STF.

O descumprimento de decisões de Cortes Superiores afeta diretamente a hierarquia e a credibilidade do Poder Judiciário, na medida em que decisões proferidas por instâncias superiores estão sendo desrespeitadas por juízos com competência inferior.

Em situações como essa, entende-se que a atuação do CNJ tem papel crucial na garantia da disciplina judiciária, especialmente no que tange à obrigatoriedade de observância pelos magistrados da hierarquia constitucional e processual.

Um juiz não pode descumprir decisão de um desembargador e do tribunal; por sua vez, um desembargador não pode descumprir decisão de Tribunal Superior; e Tribunal Superior não pode afastar o cumprimento de decisão proferida pelo STF. O respeito à hierarquia do sistema garante a respeitabilidade das decisões judiciais e resguarda a segurança jurídica.

Inclusive, no julgamento da Reclamação 60.347, na qual se reconhecia o vínculo empregatício entre um motorista e o aplicativo Cabify, o STF determinou o envio de ofício ao CNJ em razão do descumprimento da decisão da Suprema Corte, objeto da Reclamação em referência.

Nesse sentido, o Conselho Nacional de Justiça tem atuado para garantir a prevalência da hierarquia do Judiciário. Todavia, como o CNJ não possui competência jurisdicional, o controle se efetiva pela via correicional, pois a inobservância da competência, revela, ao menos, nítido procedimento incorreto dos magistrados.

Em alguns casos julgados pelo CNJ, é possível verificar a ocorrência dessa atuação na esfera disciplinar. Um exemplo foi a Revisão Disciplinar de um magistrado vinculado ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), que descumpriu reiteradas vezes ordens de Habeas Corpus proferidas pelo então ministro Néfi Cordeiro, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O CNJ entendeu que a aplicação da pena de censura ao magistrado foi adequada e, por esse motivo, determinou o arquivamento do processo.

Vários casos estão sendo analisados pelo CNJ. Estava, inclusive, na pauta do órgão, a conclusão do julgamento do PAD 0002421-84.2023.2.00.0000, que trata, dentre outras imputações, da conduta de desembargador relacionada à descumprimentos de decisões do STJ.

Outro caso que ensejou apuração disciplinar foi o de magistrados do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que desrespeitaram decisão do STF sobre a Operação Lava Jato.

Esses são apenas alguns dos muitos exemplos de procedimentos em tramitação no CNJ para verificar a conduta disciplinar de magistrados em decorrência da inobservância da hierarquia do Judiciário.

Contudo, acredita-se que a avaliação da conduta disciplinar do magistrado deveria ser subsidiária – apesar de que, para a ocorrência da falta, basta o mero voluntarismo – possibilitando que o primeiro o magistrado tivesse a oportunidade de rever sua conduta após a intimação da Corregedoria Nacional ou local.

Assim, os magistrados poderiam observar adequadamente a disciplina judiciária sem sofrerem processos disciplinares gravosos que podem inclusive lhes custar a carreira.

Nesse contexto, a atuação do CNJ se torna essencial para manter a integridade e a credibilidade do Judiciário brasileiro. Ao assegurar que decisões judiciais sejam cumpridas e que a hierarquia seja respeitada, o CNJ protege a integridade do sistema judiciário e fortalece a confiança pública nas instituições judiciais.

É crucial que esse papel seja exercido com equilíbrio, proporcionando aos magistrados a oportunidade de corrigir suas condutas quando necessário e garantindo que as medidas disciplinares sejam justas e proporcionais.

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