O fim do Regime Jurídico Único

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O STF afinal julgou a ADI 2135, que discutia a alteração ao art. 39 da Constituição pela EC 19/98. A mudança extinguira o Regime Jurídico Único (RJU) instituído pelo constituinte. Em 2007, o STF reconheceu que havia vícios na tramitação da norma e concedeu medida cautelar para restabelecer o RJU. Neste mês, porém, a Corte superou o argumento de inconstitucionalidade formal e tornou válida a extinção do RJU.

Deixando de lado a discussão sobre processo legislativo, destacamos dois pontos para reflexão. O primeiro é que o RJU nunca existiu para valer. Trata-se de ficção comumente contornada por demandas administrativas. O segundo é que o seu sepultamento cria uma oportunidade para repensar os regimes de pessoal das muitas necessidades brasileiras.

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Inicie-se pela ficção. Como diria o Prof. Barbosa Moreira, o RJU é uma dessas figuras que foi sem nunca ter sido. Nunca existiu unidade, mas vários regimes de agentes atuando em nome do Estado. Veja-se, e.g., o excessivo uso de funções comissionadas em repartições públicas. Ou a abrangente permanência dos contratos temporários em escolas e universidades públicas. No Ceará, Espírito Santo e Santa Catarina, professores temporários são 60% da rede pública. Recorde-se, ainda, dos médicos e profissionais que atendem na rede pública de saúde vinculados a organizações sociais.

Em paralelo, a prevalência do regime estatutário, embora tenha dotado a burocracia brasileira de capacidade técnica e independência sem precedentes, trouxe dificuldades. De um lado, o engessamento de um regime inteiramente previsto em lei dificulta a recompensa de servidores competentes e dedicados. De outro, a garantia da estabilidade virtualmente impede o desligamento de maus servidores.

Mas sempre houve uma desculpa para isso: o RJU impediria reformas que deixassem as coisas mais claras. Daí a oportunidade trazida pela decisão do STF. Legisladores e gestores sérios poderão, enfim, desenhar modelos de pessoal compatíveis com as necessidades e características de cada função administrativa. Melhor que organizações sociais, talvez seja a contratação de médicos e enfermeiros com vínculo de emprego para atuar em hospitais públicos. Melhor que a ampliação dos vínculos temporários, talvez seja a expansão do regime celetista ou mesmo um novo formato de contratação. Melhor que relações perenes com maus funcionários que dificilmente sofrem reveses em estágios probatórios pouco efetivos, talvez seja uma contratação com período de experiência que permita avaliação mais simples.

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Que fique claro: na melhor tradição weberiana, o regime estatutário segue obrigatório para as funções típicas de estado, como manda o art. 247 da Constituição. E deve haver uma análise responsável para avaliar quando poderá ser adotado modelo diferente. Mas isso não muda a possibilidade de que se repensem relações, por vezes, insinceras e inseguras que a imposição do RJU implicava. É hora de inovar na gestão de pessoas na Administração Pública.

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