O impacto da judicialização da saúde na relação médico-paciente

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Em um aparente reflexo da maior conscientização dos pacientes sobre seus direitos, é crescente a judicialização da saúde no Brasil. Em 2023, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), foram ajuizadas 565 mil ações relacionadas à saúde, um aumento de 20% em comparação ao ano de 2022. Esse contexto é preocupante, também, para a atuação médica, pois afeta não apenas a prática clínica, mas a relação de confiança necessária para um tratamento eficaz.

O maior acesso à informação permitiu que os pacientes adquirissem maior conhecimento sobre suas condições de saúde e os tratamentos disponíveis. Esse empoderamento levou a uma postura mais proativa, com questionamentos sobre diagnósticos e sugestões de tratamentos. Em muitos casos, essa busca por informação, somada a expectativas não atendidas, nem sempre coerentes, resulta em uma maior tendência de recurso ao Judiciário.

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Por outro lado, o aumento dos processos judiciais também impacta diretamente a atuação da classe médica, que, em muitos casos, passa a adotar práticas de medicina defensiva, prescrevendo exames para ratificação de suas análises clínicas ou até mesmo evitando tratamentos de maior risco, ainda que potencialmente benéficos.

Essa postura aumenta custos e sobrecarrega o sistema, prejudicando o atendimento focado nas reais necessidades do paciente. Além disso, reduz a confiança entre médico e paciente, enfraquecendo o relacionamento e impactando no sucesso do tratamento.

A possibilidade constante de processos provoca, ainda, estresse e desgaste emocional nos profissionais, especialmente devido à demora na resolução dos casos. Muitos profissionais se sentem injustiçados, já que falhas estruturais do sistema de saúde são frequentemente interpretadas como responsabilidade pessoal.

Uma demonstração prática desse sentimento foi o questionamento feito pelo Colégio Brasileiro de Cirurgiões (CBC), com o apoio institucional do Conselho Federal de Medicina (CFM), quando à nomenclatura utilizada pelo CNJ para classificação de processos, que adotava a terminologia “erro médico” para designar genericamente ações em que se discutia a caracterização da responsabilidade civil de profissionais e estabelecimentos de saúde.

Em resposta, o CNJ alterou a classificação dos processos, modificando o termo “erro médico” por “responsabilidade civil do profissional da saúde”. A medida, no entendimento do CFM, busca reduzir a estigmatização dos profissionais e promover uma análise mais técnica dos casos, equilibrando a proteção ao exercício médico e a defesa dos direitos dos pacientes.

A confiança é fundamental para a adesão do paciente ao tratamento e para a eficácia do cuidado prestado. Pacientes que se sentem acolhidos por seus médicos tendem a seguir melhor as orientações, fornecer informações relevantes e se engajar mais no processo terapêutico. Por outro lado, os médicos que operam em um ambiente de confiança podem tomar decisões mais assertivas, sem o receio constante de ser questionado  judicialmente.

Vê-se que a maior judicialização da saúde no Brasil traz desafios que vão além dos tribunais, impactando a prática médica e a relação entre médicos e pacientes, o que demonstra a importância de uma melhor gestão de expectativas e uma comunicação mais eficaz entre médicos e pacientes.

Os profissionais de saúde precisam se adaptar a esse cenário, desenvolvendo habilidades de comunicação, humanização e prevenção de conflitos. De outro lado, embora a busca pela garantia de direitos seja legítima, o impacto da quebra de confiança na relação médico paciente traz efeitos nocivos também para o paciente, sendo essencial encontrar um equilíbrio que preserve a confiança mútua e restaure o entendimento da importância desse vínculo para toda a sociedade.

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