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O mercado de criptoativos e as estruturas de regulação financeira

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Nos últimos dias de 2024, o Banco Central (BC) convidou o mercado a se manifestar sobre suas propostas para regulamentar o mercado de criptoativos no Brasil. No exercício das competências que lhe foram atribuídas pela Lei nº 14.478/22 e pelo Decreto nº 11.563/23, o BC publicou a Consulta Pública nº 109/24, sobre as prestadoras de serviços de ativos virtuais e demais instituições já autorizadas a funcionar pelo BC que pretendam prestar referidos serviços (PSAV); além das Consultas Públicas nº 110/24 e nº 111/24, também relacionadas aos mercados de criptoativos.

Dados da Receita Federal informam que cerca de 4 milhões de brasileiros executam operações com criptoativos todos os meses no Brasil, movimentando mensalmente entre 15 e 20 bilhões de reais. É passada a hora de o país contar com uma regulação dos seus mercados de criptoativos que esteja inserida no contexto global dos investimentos em ativos virtuais e que, ao mesmo tempo, garanta o cumprimento das diretrizes previstas no art. 4º da Lei nº 14.478/22.

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Para tanto, a minuta disponibilizada pelo BC combina elementos típicos de regulação prudencial – autorização de funcionamento e requisitos mínimos de capital – e de regulação de condutas, como deveres e responsabilidades impostos às PSAVs para prevenção e combate à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, a práticas abusivas e a conflitos de interesses.

Neste momento em que as discussões acerca de uma possível revisão sobre a organização das estruturas de regulação financeira ganham tração no país, com debates sobre a adoção do modelo twin peaks no Brasil – pelo qual estruturas de regulação financeira são estabelecidas não mais em função das matérias reguladas mas em razão do tipo de regulação, de modo que enquanto uma seria responsável pela regulação prudencial dos mercados financeiros, de capitais e securitários; a outra seria competente para exercer a regulação das condutas dos agentes desses mesmos mercados – faz-se oportuna a avaliação sobre a abordagem prudencial e de condutas proposta pelo BC para os nossos mercados de criptoativos, especialmente se considerarmos que o modelo sugerido concentra estruturas de regulação prudencial e de condutas no mesmo regulador, relegando a eventual adoção do modelo twin peaks, ao menos nos mercados de criptoativos, a meras digressões hipotéticas de cunho acadêmico.

A proposta contida na Consulta Pública nº 109/24 trata adequadamente dos aspectos prudenciais inerentes à regulação do mercado de criptoativos, o que já era antecipado pelo mercado uma vez que o BC é o regulador prudencial por excelência do mercado financeiro nacional.

Nessa toada, ao submeter o funcionamento das PSAVs à autorização prévia e condicionada ao cumprimento de requisitos financeiros, patrimoniais, técnicos, tecnológicos e organizacionais, o BC atua incisivamente para fomentar a integridade, a transparência e a solidez dos mercados de criptoativos no país; protegendo investidores e contribuindo para o aumento da confiança na segurança dos mercados de ativos virtuais.

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Requisitos de acesso também contribuem para encorajar as PSAVs a adotarem uma gestão financeira resiliente, permitindo que resistam a flutuações econômicas e sigam prestando serviços de ativos virtuais. A gestão de riscos sistêmicos é, de fato, um elemento crítico que deve ser adequadamente endereçado pelo BC, especialmente se considerarmos tratar-se de um mercado recém-criado, intrinsecamente interconectado aos sistemas bancário e financeiro e altamente dependente de tecnologia DLT, da qual o blockchain é o seu maior representante.

No entanto, quanto aos elementos de regulação de condutas, a proposta do BC é tímida quando se limita a impor às PSAVs a implementação de políticas de monitoramento de ofertas e operações para identificar práticas abusivas como manipulação de preços, criação de condições artificiais de oferta ou demanda e insider trading; políticas de know your client e suitability; regras de formação de preços; além de políticas tratando do disclosure de operações de carteira própria e mitigação de conflitos de interesses.

É sabido que regras são tão boas quanto a certeza da sua aplicação. É sabido, também, que a regulação de condutas caminha pari passu com a necessária capacidade do regulador para fiscalizar as condutas dos participantes e sancionar adequadamente os agentes infratores. Parece-nos que, no que tange aos mecanismos de supervisão de condutas e enforcement das normas, a norma proposta pelo BC poderia trazer estruturas mais robustas, já testadas e aprovadas no país, como as estruturas de autorregulação adotadas pela CVM no mercado de capitais.

Em linhas gerais, o quadro normativo e regulatório do mercado de capitais brasileiro estabelece que a garantia da sua integridade, higidez e transparência constitui responsabilidade compartilhada pelos agentes que nele atuam – reguladores, autorreguladores, administradores de mercados organizados e seus participantes – sendo certo que cada qual se desincumbe da sua respectiva obrigação nos termos das normas que lhe são aplicáveis.

Nesse modelo, compete à CVM fiscalizar as atividades desempenhadas e os serviços prestados nos mercados de valores mobiliários; apurar indícios de infrações mediante processo administrativo cujos ritos são dados pela Resolução CVM nº 45/21; bem como aplicar as sanções cabíveis. Para tanto, a CVM se vale de estruturas de autorregulação para, por exemplo, monitorar e supervisionar ofertas e operações executadas nos mercados organizados; fiscalizar seus participantes e aplicar sanções, nos termos do art. 47 e seguintes da Resolução CVM nº 135/22.

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Se é fato que a Lei nº 14.478/22 e o Decreto nº 11.563/23 atribuíram ao BC a competência para regular os mercados de criptoativos no Brasil, é fato também que, ao BC, compete exercer seu papel de regulador sistêmico, prudencial e de condutas, estabelecendo condições de acesso a esses mercados, atribuindo obrigações e responsabilidades às PSAVs, estabelecendo mecanismos para o monitoramento, supervisão e fiscalização dos mercados e de seus participantes, e punindo os infratores. Para tanto, no exercício da sua função de regulador de condutas, o BC poderia propor estruturas de autorregulação que entregassem, aos participantes dos mercados de criptoativos, os benefícios observados na autorregulação dos mercados de capitais, como a proximidade com o mercado e a agilidade na atuação.

Até fevereiro de 2025, os agentes dos mercados de criptoativos poderão apresentar comentários e sugestões para aprimoramento da modelagem regulatória sugerida pelo BC. Esperamos que aspectos da fiscalização, supervisão, monitoramento e enforcement do mercado de criptoativos concentrem grande parte das manifestações do mercado, para a plena materialização das diretrizes encartadas no art. 4º da Lei nº 14.478/22.

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