Presidente do INSS prevê gasto previdenciário normalizando entre agosto e setembro

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O presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto, prevê que a curva de gastos da Previdência, um dos temas de maior inquietação no debate fiscal brasileiro, retornará ao patamar de normalidade a partir da janela entre agosto e setembro. Segundo ele, é natural que essa curva tenha aumentado desde o início do governo, a um ritmo da ordem de 0,6% ao mês, porque a pasta trabalhou intensamente para reduzir a fila e o estoque de cidadãos aguardando benefícios. Mas nesse segundo semestre, diz, o crescimento vegetativo habitual deve ficar na casa de 0,15% por mês.

Stefanutto considera um erro de avaliação do mercado projetar a continuidade do ritmo anterior de expansão dessa despesa. E destaca que a estratégia de ampliar a fila era uma maneira incorreta de reduzir os gastos, uma espécie de “pedalada” fiscal que foi corrigida.

Ele avalia como “açodada” a tentativa de se fazer uma discussão de uma nova reforma da Previdência. Em sua visão, essa rubrica é sustentável e não demanda reforma por pelo menos mais cinco anos. Apontou ainda que não se deve olhar isoladamente para essa rubrica orçamentária sem considerar que há outros gastos com problemas, como a conta de juros, que está chegando a 8% do PIB.

O comandante do INSS defendeu a política de reajuste real do salário mínimo e salientou o aspecto distributivo dessa política e da Previdência de forma geral. Lembrou que o déficit na área está concentrado na rural, enquanto a urbana é superavitária.

Para ele, a despeito de ter acelerado no curto prazo o volume de gastos, ao ajudar a reduzir as filas, o Atestmed na prática reduz custos com o auxílio-doença. Isso porque ele encurta o tempo de acesso e, consequentemente, de pagamento do benefício, mesmo considerando situações de eventuais fraudes.
Leia abaixo os principais pontos da entrevista ao JOTA.

Dificuldade em convencer o mercado sobre a projeção para o gasto previdenciário

Quando vamos fazer predição matemática, nós temos duas formas de fazer isso. Uma é a predição que o pessoal de orçamento faz — eles não sabem se eu estou tratando a fila, se estou acelerando a concessão de benefícios, se ela diminuiu, enfim. E isso influencia nos gastos, ainda que seja uma postergação.

O uso da perícia, antigamente, antes de mudarmos o modelo por benefício por incapacidade rápida, faz uma mudança qualitativa na projeção. E que técnico de orçamento não vê. E alguns economistas, com devido respeito pois já usei muitos como fonte científica, às vezes tem dificuldade de se aprofundar e saber o que está acontecendo.

Eu penso que todo mundo que está apostando, e tem suas razões para apostar contra a projeção do governo, não está levando em consideração as mudanças que foram feitas para colocar a fila no lugar e em que estágio estamos da fila, e o que estamos fazendo agora.

Então primeiro, quando a gente assume, tem que baixar o tempo de espera. A população não pode esperar um benefício por seis meses. Até porque quando ela espera por seis meses no caso da perícia [médica, para o auxílio-doença], eu pago esses seis meses. Se você quebra o dedo e precisa ficar quarenta dias fora, você volta para o seu veículo seis meses depois, e isso é ruim para todo mundo. E além de tudo eu pago o período extra que você ficou. Se eu te devolvo logo para o mercado, eu pago menos. Quando começamos essa mudança estruturante na perícia nós não inventamos a roda, os países ocidentais do sul da Europa todos fazem e o próprio serviço público faz. Você apresenta um atestado e isso é usado.

Constatou-se que é mais barato acreditar na pessoa do que a gente fazer a perícia.
Claro que isso fez com que 1 milhão e 300 mil perícias que estavam estocadas caíssem para algo em torno de 400 e 500 mil. O fato é que o número médio para concessão dos benefícios do INSS, que deve piorar um pouco por conta das férias e da greve, é de 36 dias. Esse é o dado mais recente. O número de julho deve ser um pouco pior, mas abaixo de 45 [dias] certamente. Então nós trouxemos a média, que é a mais difícil de baixar, de 89 dias no último governo para 36 dias.

Quando o INSS traz todos os benefícios mais rapidamente, acontece um aumento de gastos. Porque eu pego no estoque quem está lá e essa pessoa é mais cara pois ela já fez o pedido há muitos meses, então quando receber, recebe tudo de uma vez. Eu pego esse conjunto de segurados que estão no estoque, alguns há anos, e começo a fazer o que eu chamo de cidadania: o acerto da vida dessas pessoas. Obviamente o gráfico do gasto inclina para cima e nós trabalhando, queimando essa fila. Tínhamos uma fila estimada, dada pelo governo anterior na prestação de contas do seu próprio governo, 2,5 milhões de pessoas na fila e hoje todo mês entra mais ou menos um milhão de requerimentos de pedidos novos.

Tenho na fila hoje trezentas mil pessoas, pois o outro milhão é o que entra todo mês de pedidos novos. O estoque é de 300 mil. Caiu então mais ou menos 2 milhões e 200.

Com toda essa tração que a gente deu, é natural que a curva de gastos aumente, exatamente porque o INSS está entregando mais benefícios. Mas é óbvio que ou passamos ou estamos chegando nesse dia de que essa curva de gasto volta para o lugar normal. Ela nunca vai cair porque tem o crescimento vegetativo [do número de beneficiários], mas ela [a curva] tende a diminuir o crescimento. Nós tivemos alguns sinais disso já em junho. Mas nós acreditamos que chegaremos em agosto ou setembro com a curva já quase igual à habitual, de crescimento vegetativo por mês de 0,15% (estava em 0,6%). “Quando eu não entrego um benefício rápido, eu estou pedalando , e com os pobres”.

Revisão de cadastros

BPC, etc, eu só consigo fazer [revisão] se eu tenho capacidade operacional. Então com a arrumação da primeira fase, o próprio Atestmed, eu consigo fazer outros movimentos. Estamos fazendo a perícia dos benefícios por incapacidade que estão alongados. Estamos fazendo todas as perícias e revendo se a pessoa tem condição ou não de receber o benefício. Dentro dessa fase, tem as revisões que a lei manda fazer: BPC, revisão do benefício, e isso tudo a lei que manda fazer a cada dois anos. E isso não estava sendo feito […] A melhor forma de gasto é fazer permanentemente esse tipo de revisão.

Auxílio doença e inteligência artificial

Primeiro, a população tinha que gostar do Atestmed. E ela gostou. Em segundo, você melhora os parâmetros de auditoria, que é onde estamos. E na última fase o sistema vai estar redondo, funcionando por automação, com os dados diretos do SUS. Tudo isso que nós estamos falando da inteligência artificial você não usa só para atestado, você vai usar pra outras coisas também aqui no INSS. A fase seguinte é aquela em que só existirá no Brasil atestado eletrônico. E nós não estamos longe disso. Vai acabar a fraude? Ainda não, porque sempre existe o “médico amigo”, que te dá um atestado, etc. Isso é um problema no mundo todo, mas é um resíduo, não é estrutural.

Temos que sobrepesar quanto eu estou gastando e o que eu estou oferecendo à população. Eu recebi alguns estudos feitos pelo secretário de previdência e da perícia médica que mostram que o gasto [com auxílio-doença] continua próximo de 5%. Historicamente o benefício por incapacidade só gastava 5% do total. Nós continuamos gastando menos de 5%. Então, ainda que você tenha expedido mais benefícios, é verdade, nós estamos gastando praticamente a mesma proporção, até um pouco menos.

O que indica isso: o Atestmed pode até conceder para mais pessoas, mas como ele concede prazos mais curtos, eu estou gastando praticamente a mesma porcentagem, quase 5%, mas estou dando benefício para a pessoa em 14 dias. Isso é um valor importante porque de que adianta eu pagar a pessoa daqui a 8 meses? Vira um seguro indenizatório, não é mais proteção social. Eu acredito que com as mudanças, com as evoluções, com a auditoria, a gente melhore mais ainda, mas não que vai cair de 4 ou 5 para 2%.

Fraudes no INSS

Essas histórias de que o INSS tem um monte de fraude e tal é mais intuição do que dados e fatos. Quando o Tribunal de Contas fala 11,2%, ele não está falando que tem isso de fraude, ele está falando de possíveis irregularidades. Muitas vezes tem uma irregularidade no benefício que se a pessoa conserta, ela continua com o benefício, como BPC. As pessoas acham que tem mais fraude do que aparenta ter. O INSS, quando se vê uma operação da PF, senão todas, a maioria, somos nós que identificamos, seja de volumetria seja qualitativo. Nós monitoramos os nossos servidores. Tem fraude? Obviamente que tem, o crime organizado sempre está tentando.

Impacto da fila no gasto

Não fizemos essa conta, mas estamos fazendo, porque se tornou relevante explicar. Esse fator distorce e todo mundo que fala não o inclui. A nossa perspectiva da curva voltar ao normal não é um sonho, é uma realidade. Somado que estou fazendo revisão de estoque, ou seja, tem benefício sendo cancelado quando a pessoa não tem direito, isso também vai ajudar a melhorar a curva mais rápido do que seria. Estamos acabando uma fase acelerada. Estamos pagando o servidor para produzir mais. Claro que isso aumentou o gasto. O que os meus amigos economistas não querem pôr na cabeça é que tem um ganho enorme de eficiência.

Ritmo de gasto de longo prazo e reforma

Temos dois tipos de reforma: a paramétrica e a estruturante. A paramétrica mexe só nos parâmetros, idade, tempo de contribuição, etc. É um cálculo matemático que nem sempre corresponde ao físico. Essa foi a reforma de 2019, paramétrica, e é um movimento importante, precisa ser organizada a questão de subir a idade, mas essa reforma não pode ser a única. Isso porque quando você mexe só em parâmetros, principalmente idade e tempo de contribuição, você descola da realidade do Brasil. Você se descola da velhice humana, orgânica e da velhice jurídica.

A Previdência não é só quanto se paga e reforma. É [também] o resultado disso na economia. Esse dinheiro estimula a economia por meio do consumo e volta para o Estado através dos impostos. A política de valorização do salário mínimo dos governos Lula e Dilma melhora a distribuição de renda. A melhor forma de dividir renda e estimular consumo passa pela previdência e essa política é correta.

A Previdência é sustentável nos próximos 5 ou 7 anos. Para fazermos uma nova reforma, o correto é esperar pelo menos 10 anos completos da última. Fizemos uma reforma em 2019 e tem gente discutindo isso em 2024, com apenas 5 anos. É pouco. Sou contra se fazer um debate açodado. Ele precisa ser completo e não se restringir apenas aos valores.

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