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Neste artigo, abordaremos os principais problemas identificados no PLP 68/2024 em relação à tributação dos serviços financeiros, incluindo as indefinições normativas que podem gerar insegurança jurídica e conflitos federativos, além da relação entre o IOF e o IBS, com risco de dupla tributação e a falta de clareza sobre as competências.
Indefinição de destinatários
Um dos principais problemas do PLP 68/2024 é a falta de clareza sobre quem seriam os destinatários de alguns serviços financeiros, como a administração de fundos de investimento e consórcios. O artigo 170 prevê a incidência do IBS e CBS sobre esses serviços, mas não detalha os destinatários.
Esse tipo de indefinição normativa é similar à que foi declarada inconstitucional pelo STF na ADI 5.835. Na ocasião, o STF considerou inconstitucional a falta de clareza sobre o local de incidência do ISS em alguns serviços, o que gerou insegurança jurídica para os contribuintes e conflitos de competência entre os entes federativos.
A mesma preocupação se aplica ao PLP 68/2024, pois a ausência de uma definição clara sobre os destinatários dos serviços financeiros pode levar a disputas entre os entes federativos, especialmente no que diz respeito à distribuição da arrecadação do IBS.
Ainda que o PLP 128 mencione, indiretamente, que os cotistas de fundos e consorciados seriam os destinatários, o texto não trata de forma clara da sujeição passiva ou do local de ocorrência da operação. Isso pode resultar em uma indeterminação normativa que compromete a segurança jurídica, repetindo problemas já enfrentados em outras áreas da tributação.
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Conflito federativo
Outro ponto relevante é o risco de conflitos federativos sobre a definição do local da operação para fins de incidência do IBS. O PLP 68/2024 determina que a receita decorrente do recolhimento do IBS sobre serviços financeiros seja com base no domicílio principal do destinatário, conceito que pode gerar interpretações divergentes.
No caso do arrendamento mercantil, o art. 125, II, b, estabelece que o destinatário é o contratante/arrendatário, e a receita do IBS deve ser distribuída ao estado ou município do domicílio principal desse contratante. Para pessoas físicas, ele define o domicílio principal como o local da habitação permanente ou, na ausência dessa, onde as relações econômicas forem mais relevantes, o que ainda deixa espaço para disputas.
Por exemplo, imagine um contrato de arrendamento mercantil firmado em São Paulo, por uma contribuinte que possui residência profissional em Santos e com domicílio civil no Guarujá. Nesse caso, Santos poderia alegar que as relações econômicas mais relevantes estão ali, enquanto Guarujá poderia reivindicar a receita do IBS com base no domicílio civil. Essa indefinição pode gerar disputas federativas recorrentes, comprometendo a eficácia do sistema tributário.
Aumento de complexidade operacional
O aumento da complexidade operacional para os fornecedores de serviços financeiros é outro ponto de preocupação. O art. 125, II, d, indica que o destinatário do serviço é cada cotista de um fundo de investimento, o que exige que instituições financeiras calculem e recolham o IBS para cada cotista, gerando sobrecarga operacional.
Esse aumento na complexidade operacional reflete-se em custos adicionais, pois as instituições precisarão de sistemas mais sofisticados para rastrear e calcular o IBS com precisão para cada cliente. Além disso, novas normas para serviços financeiros podem gerar dúvidas interpretativas, aumentando o risco de litígios e contestações judiciais.
Restrições de crédito e regime cumulativo
O §4º do art. 181 impõe restrições à apropriação de créditos do IBS e da CBS na aquisição de serviços financeiros, permitindo o aproveitamento apenas se o pagamento for reconhecido pelo Comitê Gestor do IBS e pela Receita Federal, o que dificulta o aproveitamento e reforça a cumulatividade.
Além disso, os artigos 182 e 192 proíbem expressamente a apropriação de créditos do IBS e da CBS em operações de intermediação financeira, câmbio, títulos e valores mobiliários, securitização, faturização e serviços prestados a fundos de investimento, entre outros. Essa limitação pode impactar negativamente a não cumulatividade, especialmente em setores que dependem intensamente de serviços financeiros, como o mercado de capitais.
Desafios da base de cálculo e alíquotas
A definição da base de cálculo dos serviços financeiros no PLP 68/2024 segue o modelo de tributação sobre o valor adicionado. O artigo 174 determina que o IBS e a CBS incidirão sobre a receita das operações financeiras, excluindo reversões de provisões e recuperações de créditos baixados como prejuízo. No entanto, a inclusão do spread bancário[1] nessa base preocupa, pois em países como Canadá e na União Europeia, o spread não é tributado, sendo isentos e tributando apenas taxas e comissões.
A decisão do Brasil de incluir o spread na base de cálculo do IBS e da CBS diverge das práticas internacionais e pode gerar distorções no mercado financeiro, elevando o custo do crédito e impactando negativamente o consumidor com juros mais altos.
Além disso, o PLP 68/2024 parece repetir a base de cálculo cumulativa utilizada no PIS e a Cofins, o que contraria o princípio de não cumulatividade, e assemelha o IBS e a CBS a tributos sobre lucro, como o IR e a CSLL, suscitando dúvidas sobre sua adequação.
Conflito IOF versus IBS
A relação entre o IOF e o IBS é uma das questões mais controversas na tributação de serviços financeiros com a introdução do IBS e CBS. O IOF, criado pela Lei nº 5.143/1966 e incorporado ao CTN, incide sobre operações de crédito, câmbio, seguro e títulos, com função regulatória para controle de crédito e política monetária.
Com a criação do IBS, surge a questão de um possível conflito de competência: a União tributa serviços financeiros via IOF, enquanto estados e municípios poderão tributar os mesmos serviços pelo IBS, o que pode resultar em dupla tributação, contrariando o objetivo de simplificação do sistema tributário.
Embora o IOF tenha natureza extrafiscal, sua coexistência com o IBS pode gerar incertezas e insegurança jurídica. A Constituição deveria ter estabelecido a extinção do IOF ou limites claros para evitar sobreposição de tributos, mas sua manutenção ao lado do IBS abre margem para litígios entre contribuintes e o Fisco.
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Conclusão
O PLP 68/2024 apresenta uma série de inovações no que tange à tributação de serviços financeiros, mas traz consigo desafios e incertezas que precisam ser resolvidos para garantir o sucesso da reforma tributária. A falta de clareza na definição dos destinatários dos serviços financeiros, a possibilidade de conflitos federativos sobre a distribuição de receitas e o aumento da complexidade operacional são alguns dos principais problemas identificados.
Além disso, a inclusão do spread bancário na base de cálculo do IBS e da CBS representa uma divergência em relação às práticas internacionais e pode gerar distorções no mercado financeiro, elevando o custo do crédito e dificultando o acesso aos serviços financeiros.
Por fim, a coexistência do IOF com o IBS levanta questões constitucionais e de competência tributária, que precisam ser resolvidas para evitar a dupla tributação e garantir a simplificação do sistema tributário brasileiro.
[1] Diferença entre o que uma instituição financeira paga para captar recursos e o que ela cobra para emprestar esses recursos.