No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

pensamento do dia

Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

Salário-maternidade, contribuições previdenciárias e os desdobramentos das afastadas na pandemia

Spread the love

A pandemia de Covid-19, além de ter impactado profundamente a saúde pública, trouxe diversos desafios ao Direito do Trabalho e ao Direito Tributário. Dentre os inúmeros pontos de atenção que surgiram nesse contexto, destaca-se o afastamento de empregadas gestantes do ambiente de trabalho presencial, instituído pela Lei 14.151/2021, e a controvérsia sobre a natureza jurídica dos pagamentos efetuados neste período. Discute-se, em especial, se tais valores podem ser considerados salário-maternidade, de modo a possibilitar a compensação ou restituição de contribuições previdenciárias.

Em agosto de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou importante precedente ao julgar o Recurso Extraordinário (RE) 576967 (Tema 72), declarando inconstitucional a cobrança de contribuição previdenciária patronal sobre o salário-maternidade. A Corte reconheceu que a trabalhadora gestante, ao ficar afastada de suas funções, não presta serviço ao empregador nesse período, de modo que o salário-maternidade não poderia ser considerado como remuneração vinculada à prestação de trabalho. Assim, a verba passou a ser vista como um benefício previdenciário, cabendo exclusivamente à Previdência Social o respectivo encargo.

A razão subjacente a essa decisão encontra guarida não apenas na interpretação literal das normas previdenciárias, mas também em princípios constitucionais. Segundo o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, tributar o empregador em razão de um período no qual a mulher é protegida pela legislação quanto à maternidade se converte em obstáculo à contratação de mulheres, tornando a licença-maternidade um ônus específico para quem emprega. Tal ônus agrava a discriminação de gênero no mercado de trabalho e contraria a isonomia prevista na Constituição.

Baixe relatório exclusivo com os votos sobre uberização de 19 ministros do TST

Após a publicação da Lei 14.151/2021, determinando o afastamento das trabalhadoras gestantes do trabalho presencial enquanto perdurasse o estado de emergência de saúde pública, emergiu nova discussão acerca de quem suportaria os valores pagos durante esse afastamento. O artigo 394-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) traz uma situação análoga ao prever que, em casos de atividades insalubres, a trabalhadora gestante deve ser afastada, cabendo à Previdência o pagamento do salário-maternidade caso não haja possibilidade de transferência para função salubre.

Contudo, a Lei 14.151/2021 não foi expressa quanto à hipótese de impossibilidade do trabalho remoto, deixando em aberto se o valor pago nesse período caracterizaria ou não salário-maternidade. Desse modo, inúmeras empresas buscaram judicializar a questão para recuperar contribuições previdenciárias, entendendo que tais gastos deveriam ser suportados pelo Poder Público. 

A Turma Nacional de Uniformização (TNU), no julgamento do Tema 335, em setembro de 2024, trouxe novo fôlego aos debates ao reconhecer que, para as empregadas gestantes afastadas em virtude da Lei 14.151/2021, deveria incidir o mesmo raciocínio aplicado ao salário-maternidade. Ou seja, quando a empregada não puder efetivamente desempenhar suas funções à distância, os valores pagos pelo empregador poderiam ser enquadrados como salário-maternidade.

Isso implica que, além de não haver incidência de contribuição previdenciária sobre tais valores, o pagamento efetivo do salário-maternidade deveria ser realizado pela Previdência Social, permitindo ao empregador a compensação do montante pago em recolhimentos futuros. Essa interpretação segue a lógica de que, na ausência de prestação de serviços e de disposição da trabalhadora ao empregador, a verba assume natureza de benefício previdenciário e não de remuneração.

Antes disso, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, o Tema 1295 (leading case RE 1472734) não teve repercussão geral reconhecida, conforme decisão proferida em março de 2024. O STF concluiu que a controvérsia acerca da natureza jurídica da verba paga às gestantes afastadas pela Lei 14.151/2021 é matéria infraconstitucional, devendo, portanto, ser enfrentada de maneira definitiva pelo STJ.

Nesse passo, todos os olhares se voltam agora ao julgamento do Tema 1290 no STJ, marcado para iniciar em 6 de fevereiro de 2025. Sob relatoria do ministro Gurgel de Faria, a Primeira Seção analisará a legitimidade passiva ad causam (se do INSS ou da Fazenda Nacional) para responder pelo ônus do pagamento das verbas às gestantes afastadas. Também discutirá se esses valores podem ser efetivamente enquadrados como salário-maternidade, permitindo a compensação ou a restituição de contribuições recolhidas.

Para as empresas, o resultado desse julgamento é de suma relevância. Muitos empregadores já ajuizaram ações questionando a exigibilidade de contribuição previdenciária sobre os valores pagos, amparados não só na decisão do STF sobre o Tema 72 (que afastou a incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade), mas também no precedente mais recente da TNU (Tema 335). A depender do posicionamento que prevalecer no STJ, poderá haver a consolidação de um entendimento favorável à recuperação de tributos pagos a maior, aumentando a segurança jurídica para aqueles que buscam reaver tais valores.

Nesse contexto, é recomendável que as empresas revisitem seus procedimentos internos de registro e documentação das situações de afastamento e verifiquem se possuem medidas judiciais em curso sobre o tema. Isso porque o resultado positivo para as companhias também poderá depender de eventual modulação dos efeitos da decisão a ser proferida pelo STJ, sobretudo em razão da recente tendência de o tribunal modular as consequências de seus pronunciamentos, como ocorreu nas discussões relativas aos Temas 1.079 e 1.125.

Em suma, o julgamento do Tema 1290 pelo STJ coloca em evidência uma das principais questões previdenciárias decorrentes da pandemia: quem deve arcar financeiramente com a proteção às trabalhadoras gestantes quando o exercício de suas atividades à distância é impossível? A resposta envolve princípios de proteção à maternidade e de igualdade de gênero no mercado de trabalho. Conjugando-se a decisão do STF sobre a não incidência de contribuição previdenciária no salário-maternidade com a recente manifestação da TNU acerca das gestantes afastadas na pandemia, o resultado no STJ poderá produzir impacto positivo sobre as contas das empresas.

Assine gratuitamente a newsletter Últimas Notícias do JOTA e receba as principais notícias jurídicas e políticas do dia no seu email

Por ora, cabe aos empregadores acompanharem atentamente o desenrolar desse debate, mantendo-se preparados para adotar medidas jurídicas oportunas assim que houver uma sinalização definitiva. Afinal, a definição sobre a natureza jurídica e o responsável pelo custeio dessas verbas é uma peça-chave para garantir segurança, equidade e estabilidade nas relações de trabalho – ainda mais em tempos tão desafiadores quanto os vivenciados durante a pandemia.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *