No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
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Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

Saneamento básico: as oportunidades de desenvolvimento para o Nordeste

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O novo marco do saneamento básico no Brasil foi instituído pela Lei 14.026/2020 e representa uma mudança significativa no setor. Diferentemente da redação original da Lei 11.445/2007, que optou por não estipular qualquer prazo de atendimento, a nova regra determinou que a universalização dos serviços públicos de água e esgoto ocorresse até 2033.

A meta do marco regulatório é clara, necessária e ambiciosa: assegurar que, até o ano de 2033, 99% da população brasileira tenha acesso à água potável e 90% ao esgotamento sanitário.

Esse avanço regulatório vem trazendo benefícios importantes para o país, especialmente para a região Nordeste, que apresenta um grande déficit de cobertura nesses serviços essenciais.

Como veremos adiante, essas metas são particularmente desafiadoras no Nordeste, dadas as condições socioeconômicas, históricas e do relevante gap de cobertura de tais serviços básicos apresentados na região.

Ademais, como será mais bem explorado no decorrer do texto, os investimentos necessários ao desenvolvimento do setor na região Nordeste possuem o condão de impactar em aspectos relacionados tanto a saúde pública como no aumento da produtividade e, consequentemente, na renda média da região.

Por fim, é de se destacar a importância da construção de políticas públicas coordenadas capazes de promover o desenvolvimento regional. Isto porque, a previsão de investimentos significativos ao setor, tanto em ativos (Capex) como em despesas operacionais (Opex), representa uma importante oportunidade para o enraizamento da renda gerada na própria região.

Déficit de cobertura de água e esgoto

Atualmente, a cobertura de água e esgoto na região Nordeste é uma das mais baixas do Brasil. Segundo dados recentes[1], aproximadamente 35% da população nordestina não possui acesso ao sistema de esgotamento sanitário, e cerca de 20% ainda não têm acesso regular ao abastecimento água potável.

Vale ressaltar que a ausência de saneamento adequado está associada a altas taxas de doenças de veiculação hídrica tais como Cólera, Disenteria, Febre Tifoide, Hepatite Infecciosa, Leptospirose dentre outras, o que afeta a capacidade produtiva dos trabalhadores, impacta no desempenho educacional da população e em consequência reduz a participação da população no mercado de trabalho.

Com menor renda e menor escolaridade média, a região perde em competitividade, dificultando a atração de novos investimentos. É importante relembrar que, conforme estudos da Organização Mundial de Saúde (OMS), para cada unidade de valor investida no saneamento há um retorno de cerca de cinco vezes em menores custos com saúde e produtividade[2].

No entanto, as condições atuais dos serviços de saneamento disponíveis no Nordeste terminam por afetar dramaticamente a renda média da população da região[3], que vai se perpetuando num patamar significativamente abaixo da média nacional, conforme se observa do gráfico abaixo.

Metas do marco até 2033

Com a implantação do novo marco regulatório, a expectativa é que o Nordeste receba investimentos significativos para reduzir as desigualdades regionais no acesso ao saneamento.

Isto porque, o novo marco objetivou criar um ambiente regulatório que promovesse a eficiência econômica, possibilitando a redução de custos de transação e a criação de incentivos adequados para a melhoria dos serviços de saneamento no Brasil. Com isso, espera-se que ocorra um aumento dos investimentos no setor, com a consequente ampliação do acesso aos serviços de saneamento básico.

Para atingir as metas do marco de saneamento até 2033, o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), elaborado em 2023, estima uma demanda por investimentos da ordem de R$ 400 bilhões para o país[4]. A região Nordeste necessita de R$ 100 bilhões em investimentos, montante considerável que exige um esforço coordenado entre governo, setor privado e instituições financeiras. O gráfico abaixo estima os investimentos necessários em cada Estado da região.

Esses recursos são necessários não apenas para expandir a rede de água e esgoto, mas também para modernizar as infraestruturas existentes, muitas das quais operam com baixa eficiência e perda significativa de água.

Esse investimento substancial tem o potencial de gerar milhares de empregos diretos e indiretos na construção, manutenção e operação dos sistemas de saneamento, além de estimular a economia regional.

Oportunidades

O avanço do saneamento no Nordeste cria um cenário favorável para o adensamento da cadeia produtiva local, promovendo o desenvolvimento regional e o aumento da complexidade produtiva.

A necessidade de infraestrutura e serviços de saneamento pode ser aproveitada para estimular o fornecimento de bens e serviços com conteúdo local (produzidos na própria região), desde materiais de construção até tecnologias de monitoramento e tratamento de água.

O fortalecimento da cadeia produtiva de saneamento com fornecedores regionais pode impulsionar o desenvolvimento de uma economia mais complexa e diversificada. E aqui se identifica uma oportunidade relevante para que os novos investimentos sirvam como impulso para modernização ou instalação de novas fábricas de máquinas, equipamentos e insumos em geral, tanto em Capex quanto em Opex, na região.

Para tanto, se faz necessário aprofundar o mapeamento das demandas e, sobretudo, articular e coordenar políticas e fontes de recursos para financiamento de longo prazo.

Esse processo é vital para reduzir a dependência de importações de outras regiões e fomentar a produção local, criando oportunidades para pequenas e médias empresas, elevando a geração de empregos qualificados e a renda média da população bem como promovendo uma redistribuição mais equitativa de renda.

Além disso, o crescimento de empresas locais na cadeia de saneamento ajuda a consolidar um mercado interno robusto, capaz de competir nacionalmente e, eventualmente, exportar produtos e serviços, aumentando a inserção do Nordeste na economia global.

Papel do setor público e das instituições

O papel do setor público (governos federal, estaduais e municipais) e das instituições de fomento e financiamento é essencial para a concretização das metas do novo marco de saneamento no Nordeste.

Os governos são responsáveis por realizar o planejamento do setor e criar um ambiente regulatório estável que atraia investimentos necessários. Eles também podem fomentar a formação de mão de obra local qualificada e estabelecer parcerias com instituições de ensino e pesquisa, promovendo inovação na cadeia produtiva.

Por outro lado, as instituições de fomento desempenham um papel crucial no financiamento dos projetos de saneamento, oferecendo condições de crédito acessíveis e de longo prazo. Essas instituições também podem apoiar programas de capacitação para empresas locais, fortalecendo a economia regional.

A coordenação entre essas diversas instituições é fundamental para garantir que o setor de saneamento se desenvolva de forma sustentável e inclusiva, gerando benefícios econômicos e sociais para toda a população nordestina.

Conclusão

O novo marco do saneamento no Brasil abre portas para o desenvolvimento da infraestrutura de água e esgoto no Nordeste, oferecendo não apenas melhorias diretas para a saúde e qualidade de vida da população, mas também oportunidades de desenvolvimento econômico.

Ao investir em uma cadeia produtiva local robusta, fortalecida pelo conteúdo regional e pela complexidade produtiva, o Nordeste pode elevar a renda média, reduzir desigualdades e tornar-se um polo de inovação no setor de saneamento.

Esses esforços coordenados entre governo, setor privado e instituições financeiras são essenciais para que a região alcance, de forma sustentável, as metas estabelecidas, promovendo um desenvolvimento mais justo e próspero.

[O artigo não reflete necessariamente a opinião do BNDES]

Referências

FERREIRA, Diogo Cunha; GRAZIELE, Ingrid; MARQUES, Rui Cunha e GONÇALVES, Jorge. Investment in drinking water and sanitation infrastructure and its impact on waterborne diseases dissemination: the Brazilian case. Science of The Total Environ. V. 779. 2021.

MONTEIRO NETO, Aristides. A urgência de coordenação de políticas produtivas no território: mirando o enfrentamento da crise institucional e econômica recente, de 2015 a 2022. Brasília, DF: Ipea. Texto para Discussão nº 3036. 2024.

OLIVEIRA, Carlos Wagner De Albuquerque e CRUZ, Bruno de Oliveira. Impactos Regionais de Choques de Produtividade e Redução de Desigualdades: O Caso da Região Nordeste. Brasília, DF: Ipea. Texto para Discussão nº 2694. 2021.

ROCHA, Rudi; SOARES, Rodrigo R. Water scarcity and birth outcomes in the Brazilian semiarid. Journal of Development Economics, V. 112. 2015. Págs 72-91

SCRIPTORE, Juliana Souza e AZZONI, Carlos Roberto e MENEZES-FILHO, Naércio Aquino. Os impactos do saneamento básico sobre a educação: usando a privatização como variável instrumental. In Anais. Niterói: ANPEC, 2018. Disponível em: https://www.anpec.org.br/encontro/2018/submissao/files_I/i10-8a330b78c09d0b456ce116d1d893df4d.pdf. Acesso em: 30 nov. 2024.

TEIXEIRA, Felipe Orsolin e NOGUEIRA, Mauro Oddo. A Armadilha do paradoxo de tostines: financiamentos do BNDES por porte de empresas e seu potencial na transformação estrutural das microrregiões do Brasil. Brasília, DF: Ipea. Texto para Discussão 3049. 2024.

ZHANG, Shengling; LI, Yu; ZHANG, Yipeng; ZHI-NAN, LU e HAO, Yu. Does sanitation infrastructure in rural areas affect migrant workers’ health? Empirical evidence from China. Environmental Geochemistry and Health. V. 42. 2020. Págs 625–646.


[1] Disponível em: https://www.gov.br/cidades/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/saneamento/snis

[2] Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/sanitation

[3] Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/39262-ibge-divulga-rendimento-domiciliar-per-capita-2023-para-brasil-e-unidades-da-federacao

[4] Disponível em: https://www.gov.br/cidades/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/saneamento/plano-nacional-de-saneamento-basico-plansab/cadernos-tematicos

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