No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

pensamento do dia

Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

Stock options e a indefinição sobre sua natureza: STJ x Carf

Spread the love

Em 12 de setembro de 2024, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a tese, no Tema Repetitivo 1.226, de que a aquisição de ações sob o regime de stock options (art. 168, § 3º, da Lei 6.404/1976) possui natureza mercantil. Portanto, não incide Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) tampouco Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) sobre a aquisição dessas ações pelo colaborador. Ademais, restou fixado que incidirá o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) sobre o ganho de capital obtido na revenda dessas ações.

Menos de quatro meses depois, a 1ª Turma da 1ª Câmara da 2ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) decidiu que os planos de opção de compra de ações ofertados pelas empresas aos funcionários possuem natureza remuneratória. Portanto, para o tribunal administrativo, incide contribuição social destinada à seguridade social sobre as stock options.

Conheça o JOTA PRO Tributos, plataforma de monitoramento tributário para empresas e escritórios com decisões e movimentações do Carf, STJ e STF

Mas, afinal, qual é a natureza jurídica desse instrumento: mercantil ou remuneratória? Ao longo dos anos, os tribunais administrativos e judiciais têm se posicionado ora pela natureza mercantil, ora pela natureza remuneratória. Por fim, por que o Carf não seguiu o precedente repetitivo fixado pelo Superior Tribunal de Justiça?

Pois bem.

De origem norte-americana e europeia, as stock options, ou Plano de Opções de Ações (POA), são acordos firmados entre empresas e seus colaboradores. Visando incentivar colaboradores, as empresas outorgam ao colaborador o direito de exercer uma opção de compra de determinada quantidade de suas ações ou quotas, em uma data futura e a um preço previamente ajustado.

O fundamento legal para o instrumento está disposto no § 3º do art. 168 da Lei n.º 6.404/1976, que trata das sociedades anônimas. Esse dispositivo prevê que o estatuto da companhia poderá estabelecer, de acordo com plano aprovado em assembleia geral, a possibilidade de outorga de opção de compra de ações a seus administradores, empregados ou a pessoas naturais que prestem serviços à companhia ou a sociedade sob seu controle.

Normalmente, esse instituto é revestido de algumas características, como o período inicial de carência (Cliff), durante o qual o beneficiário não poderá exercer a opção de compra das ações. Após esse período, é permitido ao colaborador adquirir gradualmente o direito de compra das ações (Vesting). Esse exercício de aquisição da opção de compra será realizado de acordo com o preço de exercício (Strike price), previamente estabelecido. Além disso, existe a possibilidade de se determinar que o beneficiário não poderá vender as ações por um período específico (Lock-up).

Exemplificando tudo isso: suponha que uma companhia, com o objetivo de reter seu diretor de engenharia, ofereça-lhe a opção de adquirir 5.000 ações ao preço de R$ 20,00 cada, sendo o valor atual de mercado R$ 25,00. O acordo prevê um período de carência (Cliff) de 1 ano, durante o qual o colaborador não poderá exercer a opção de compra. Após esse período, o plano estabelece que ele poderá adquirir as ações gradualmente (Vesting) em parcelas anuais de 1.000 ações ao longo de 5 anos. 

Caso o colaborador decida exercer a opção de compra, pagará o preço previamente ajustado (Strike price), independentemente do valor de mercado na data do exercício. Adicionalmente, o contrato estipula um período de 2 anos de restrição (Lock-up), durante o qual o colaborador não poderá vender as ações adquiridas.

É diante dessa sistemática que surgem questões trabalhistas, previdenciárias e tributárias. Como as stock options não possuem regulamentação legal específica, é comum que as empresas estabeleçam seus planos com certas distinções entre si, o que dificulta a definição de sua natureza jurídica.

Está disposto no Texto Constitucional que compete à União instituir o imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza. Renda e proventos de qualquer natureza são entendidos como acréscimos patrimoniais obtidos pelo sujeito em determinado intervalo de tempo[1]. Assim, há quem entenda que, quando o beneficiário adquire uma ação ao preço de R$ 20,00, enquanto o valor de mercado é R$ 25,00, haveria um acréscimo patrimonial relevante, para fins de incidência do imposto sobre a renda, na diferença entre o preço de exercício (Strike price) e o valor de mercado, ou seja, R$ 5,00.

É também de competência da União instituir a contribuição social (art. 149, CF/88) destinada à seguridade social, que compreende previdência, assistência social e saúde (art. 194, CF/88). Com o arquétipo disposto na Constituição, a contribuição social destinada à seguridade social incide (art. 195, CF/88), de acordo com os fins aqui pertinentes, sobre: (i) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados pelo empregador, no momento do pagamento ou creditamento (alínea “a” do inciso I do art. 195, CF/88); e (ii) o valor dos rendimentos recebidos pelo trabalhador e demais segurados da previdência social, no instante do recebimento da remuneração (inciso II do art. 195, CF/88)[2]

Após analisar os arquétipos da contribuição social, é preciso conjecturar sobre a definição dos termos ali empregados, como “salário”, “demais rendimentos do trabalho” e “rendimentos”. Conjecturamos, a partir do texto do direito positivo, que salário é a remuneração paga pelo (i) empregador ao (ii) empregado, decorrente da (iii) relação de emprego (caracterizada por não eventualidade, subordinação, onerosidade, pessoalidade e alteridade, nos termos dos arts. 2º e 3º da CLT). 

Por sua vez, os demais rendimentos do trabalho correspondem ao pagamento, a qualquer título, recebido pelo empregado como contraprestação pelo serviço prestado (art. 457 da CLT). Por fim, os rendimentos não vinculados à relação de trabalho compreendem todo recebimento, a qualquer título, de rendas ou proventos que, para fins da contribuição do empregado, estarão limitados a um teto de contribuição[3].

Assim, tanto para o imposto de renda quanto para as contribuições sociais, é determinante saber se os planos de opções de compra de ações possuem caráter remuneratório ou mercantil, pois isso impacta diretamente a materialidade de ambos os tributos.

Como mencionado anteriormente, as stock options não possuem regulamentação legal, deixando às empresas a liberdade de dispor sobre as condições dos programas de opções de ações. Nesse contexto, não há como os tribunais administrativos e judiciais se debruçarem, com base no texto do direito positivo, para definir o que são as stock options e quais seriam suas características essenciais para que se configurem como contratos mercantis. 

Para fins de incidência tributária, seja do imposto de renda, seja da contribuição social, é necessário, primeiramente, ater-se à norma de incidência dessas exações. Assim, compreendendo o alcance da norma de incidência do tributo, pode-se averiguar se, no caso concreto, o fato se enquadra na norma de incidência. 

Certamente haverá programas de opções de ações que serão atingidos pela tributação e outros que não serão. Isso ocorre porque, mais uma vez, as stock options não possuem regulamentação legal, permitindo que as empresas estabeleçam livremente seus planos, o que resulta em situações em que as características desses planos poderão enquadrar-se na definição do que é remuneração. 

Inscreva-se no canal de notícias tributárias do JOTA no WhatsApp e fique por dentro das principais discussões!

Por isso, apenas quando haver regulamentação das stock options, será possível, a partir dos enunciados do direito positivo, definir o que é stock options e o que não é. Atualmente já tramita projeto de lei (PL 2724/2022) dispondo sobre.

Por derradeiro, por que o Carf decidiu de forma diversa ao estabelecido pelo STJ? A motivação apresentada na decisão foi que o regulamento do Carf (art. 99) prevê que os conselheiros, ao julgar recursos no âmbito do Carf, somente estão obrigados a reproduzir decisões de mérito transitadas em julgado pelo Superior Tribunal de Justiça em recursos repetitivos. O que ainda não ocorreu no Tema Repetitivo 1.226.

Além disso, ponderaram que a matéria delimitada pela decisão de afetação era pertinente apenas ao tributo imposto de renda. Contudo, ao nosso ver, isso não impediria a aplicação do precedente, pois as razões de decidir dizem respeito à natureza jurídica das stock options, e, uma vez definida como mercantil, tal definição afeta tanto a incidência do imposto de renda quanto da contribuição social.


[1]  CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a Renda. São Paulo: Maleiros, 2005, p. 36/37.

[2] CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 6ª ed. São Paulo: Noeses, 2015. p. 824-826.

[3] CASTELLANI, Fernando F. Contribuições especiais e sua destinação. São Paulo: Noeses, 2009. p. 111.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *