No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

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Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

Sugestões para o aprimoramento dos julgamentos virtuais no STF

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No intuito de colaborar com o aperfeiçoamento da prestação jurisdicional no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), a Associação Brasiliense de Direito Processual Civil (ABPC) vem promovendo inciativas com o objetivo de debater possíveis melhorias nas regras que regem os Julgamentos Virtuais. Inspirados pelas recentes medidas adotadas no sentido de repensar e aprimorar sua prática,[1] a ABPC decidiu formar um grupo plural para elaborar algumas sugestões.[2]

Em nossa compreensão, serão apresentadas modificações de implementação mais singela, com baixo – ou até mesmo nenhum – custo para o Tribunal. Com o objetivo de dar visibilidade a essas ideias, trazemos ao debate público as propostas, capazes de aprofundar a comunicação externa da Corte com a sociedade civil e com a advocacia.

Soluções imediatas e com potencial baixo custo de implementação

(i) Unificação dos sistemas virtuais de julgamento

Em primeiro lugar, as deliberações sobre reconhecimento ou negativa de repercussão geral e reafirmação de jurisprudência devem ser incluídas no mesmo sistema dedicado ao julgamento dos demais processos em tramitação na Corte. A medida, além de padronizar o procedimento adotado entre os casos julgados virtualmente, proporciona a compreensão direta e imediata de eventuais votos concorrentes e votos divergentes, bem como de pedidos de vista e de destaque formulados em processos que veiculam temas a serem amadurecidos por determinada(o) ministra(o).

Igualmente, essa unificação faria com que em todos os julgamentos realizados em ambiente eletrônico houvesse a prévia publicação da pauta e intimação dos advogados e demais habilitados nos autos, de modo que pudessem aportar à Corte fundamentos relevantes.[3]

Não desconhecemos o avanço obtido com a Resolução/STF 806/2023 e com a Resolução/STF 820/2024. No entanto, a previsão normativa de intimação prévia dos advogados se limita às hipóteses em que o(a) relator(a), na mesma ocasião, propõe o reconhecimento de repercussão geral e o julgamento de mérito com reafirmação de jurisprudência.

Nessa linha e, em segundo lugar, é imprescindível a possibilidade de sustentação oral quando da análise da existência de repercussão geral (sem julgamento de mérito), da mesma forma quanto ao reconhecimento de repercussão geral com reafirmação da jurisprudência dominante (já regulamentado pela Corte). Isso por três razões.

A uma, porque, de acordo com o Regimento Interno do STF (RISTF), tanto a proposta de reconhecimento de repercussão geral quanto a de sua negativa podem receber, durante a deliberação, manifestação de reafirmação de jurisprudência. A duas, porque o STF, corretamente, tem cada vez mais percebido a relevância do espaço deliberativo prévio ao mérito da repercussão geral, inclusive com a pluralização do debate constitucional[4]. A três, a sustentação oral é fundamental para que as partes exponham as razões sobre a admissibilidade dos recursos, visto que essa deliberação possui efeitos vinculantes, ainda que específicos, e produz grande impacto em todo o sistema de administração da justiça.

Em terceiro lugar, deve haver a garantia de disponibilização imediata do voto do(a) ministro(a) relator(a) logo no início do julgamento. Nas hipóteses em que, por questões sistêmico-informáticas excepcionais, não forem publicizados, sugere-se que haja a prorrogação do prazo de duração da sessão virtual.

(ii) Divulgação prévia ao julgamento dos temas selecionados para análise de repercussão geral

Decidir sobre a natureza infraconstitucional da controvérsia (delimitando, com segurança, a esfera de competência do Superior Tribunal de Justiça – STJ) ou afirmar a relevância e a transcendência de determinada questão constitucional revela uma das decisões mais importantes do STF. Daí porque o RISTF sempre previu a possibilidade de participação de amici curiae nesse importante debate, ponto consagrado também no § 4º do art. 1.035 do CPC[5].

Assim, além da prévia publicação da pauta antes do início dos julgamentos sobre a existência (ou não) de questão constitucional e de sua repercussão geral faz-se necessária a ampla publicização, no site da Corte, dos temas pré-selecionados para deliberação colegiada. Mais uma vez, a negativa ou o reconhecimento de repercussão geral, bem assim a possibilidade de reafirmação de jurisprudência, já no ambiente virtual, são pronunciamentos com efeitos diretos, importantes e possivelmente imediatos em todo o sistema de precedentes.

A divulgação, em espaço próprio, dos temas de repercussão geral que serão deliberados pelo STF oportuniza a ciência ampla do debate pela sociedade civil. Aproxima a Corte ainda mais dos jurisdicionados e viabiliza a mobilização e a participação deles, inclusive por meio de eventuais amici curiae, capazes de contribuir para a pluralização do diálogo constitucional.

(iii) Alteração do horário de início e término das sessões virtuais

Sugere-se, ainda, que as sessões virtuais passem a ser iniciadas às 9h (das sextas-feiras, como é praticado, ou das segundas-feiras, primeiro dia útil da semana) e terminem às 18h. Isso porque não é raro que, diante da atual sistemática implementada, advogados e demais atores do sistema de justiça permaneçam em atividade no mínimo até 00h para análise do voto lançado no sistema pelo(a) ministro(a) relator(a) ou para acompanhar o encerramento da deliberação.

A alteração do horário para que o início das sessões coincida com o horário de expediente das demais profissões jurídicas é medida singela, que, de rigor, visa a proteger a saúde física e mental de todos os que contribuem mais diretamente para a formação da jurisprudência da Corte, com amplo reflexo positivo em todo o Poder Judiciário, na linha dos ODS da ONU.

Outras sugestões relevantes de solução mediata

Limitação do número de processos em julgamento por sessão

É notório que, desde a edição da Emenda Regimental (ER) 53/2020, o número de processos julgados em ambiente virtual aumentou exponencialmente. Em que pese acreditarmos que um dos direitos fundamentais processuais mais relevantes é a tempestividade da prestação jurisdicional, entendemos que a quantidade de julgamentos deve sempre estar aliada à qualidade das decisões proferidas e, em especial, à possibilidade de a sociedade civil se manter ciente e atualizada em relação ao que é debatido e decidido pela Corte.

Desse modo, sugerimos a limitação[6], por relator(a), do número de processos a serem incluídos nas sessões virtuais semanais. Tal proposta não é óbice à liberdade atual de agenda de cada ministro(a) no plenário virtual. Isso porque, caso tenha se atingido o número máximo de casos liberados para pauta virtual, os processos podem automaticamente ser incluídos na lista virtual da semana seguinte. Trata-se de uma mera postergação da inclusão (que não se aplica, logicamente, a casos excepcionais), em prol da qualidade sistêmica da deliberação colegiada.

Subsidiariamente, caso se compreenda que essa solução ainda precisaria ser mais bem amadurecida, entendemos que a limitação quanto aos julgamentos de casos ou de questões com aptidão para formar precedentes vinculantes – e.g. ações do controle concentrado, Recursos Extraordinários com repercussão geral e eventual proposta de edição de Súmula Vinculante – atenderia o objetivo de racionalização almejado, ao menos como um primeiro passo.

Possibilidade de deliberação autônoma em caso de divergência e de modulação de efeitos

Atualmente, os(a) ministros(a) podem inaugurar uma divergência até as 23h59min do último dia de julgamento, ou seja, às vésperas do horário previsto para encerramento da sessão. Não há, portanto, garantia quanto ao efetivo debate em torno da dissidência. O mesmo gargalo se repete quanto às deliberações sobre questões preliminares e prejudiciais, ou mesmo outros pontos relevantes, como a definição da tese firmada e proposta de modulação de efeitos. Como é intuitivo, o atual formato deliberativo não prestigia a exposição persuasiva de fundamentos jurídicos no colegiado, no mínimo quanto a tais temas.

Desse modo, propomos um julgamento bifásico. Na primeira parte da sessão virtual, seriam disponibilizados o voto do(a) relator(a) e proferidas as sustentações orais. O segundo momento, por sua vez, seria destinado “ao engajamento colegiado a partir das propostas de votos, com a interação de todas as perspectivas argumentativas[7].

Talvez seja prematuro afirmar, desde logo, o tempo correto a ser reservado a cada uma dessas fases de deliberação. Uma possível solução seria assegurar: (i) a possibilidade de abertura de novo ambiente deliberativo caso suscitada questão preliminar ou prejudicial por quaisquer dos votos vogais, suspendendo o julgamento de mérito, que somente terá continuidade após a deliberação sobre tal questão; (ii) abertura de novo ambiente deliberativo autônomo caso suscitada divergência quanto à proposta de tese; e (iii) abertura de novo ambiente deliberativo autônomo caso proposta modulação de efeitos pelo(a) Relator(a) ou por qualquer dos votos vogais.

Conclusão

Tais sugestões, se implementadas, têm o potencial de qualificar significativamente o desenho deliberativo da nossa Corte Constitucional, proporcionando ganhos em termos de acesso à justiça e no diálogo do Tribunal com os jurisdicionados.

Apesar de termos focado no aperfeiçoamento da prestação jurisdicional virtual do STF, não desconhecemos os problemas que a sociedade civil – e a advocacia que a representa – enfrenta em julgamentos virtuais de outros Tribunais, muitos deles em que sequer há possibilidade de se verificar o teor do voto do(a) Relator(a) e dos(as) demais ministros(as).

O ponto revela que a ausência de uniformização nacional dos julgamentos virtuais propicia gravíssima afronta à isonomia, ao acesso à justiça e às garantias processuais do contraditório e da ampla defesa. A resolução dessa questão é igualmente imperiosa e certamente será objeto de futuras colaborações específicas da ABPC.

Esperamos que essas e outras reflexões possam ser levadas em consideração, sobretudo com o incremento de novas ideias que poderão surgir a partir da leitura e do debate aqui provocado.

[1] Notadamente, a realização de sessão exclusiva para sustentações orais, com a deliberação e o julgamento deixados para um segundo momento, e o aprofundamento do diálogo no Plenário Virtual da Repercussão Geral, com a possibilidade de sustentação oral diante de possível reafirmação de jurisprudência, dois desenvolvimentos institucionais com manifestos ganhos deliberativos e democráticos.

[2] As sugestões são fruto de debates das autoras e autores em diversos ambientes acadêmicos e profissionais. Registramos, também, as contribuições prestadas pela Prof. Dra. Raquel de Andrade Vieira Alves.

[3] Em relação ao Plenário Virtual destinado à análise da existência ou não de repercussão geral e de reafirmação de jurisprudência, verificamos, até o momento, que apenas dois casos tiveram a publicação de pauta prévia com possibilidade de apresentação de sustentação oral pelas partes: RE 1.446.336 e RE 1.487.051.

[4] Um exemplo virtuoso dessa prática pode ser visto no já mencionado RE 1.446.336, em que o relator, Min. Edson Fachin, determinou a intimação e oportunizou a apresentação de sustentações orais, inclusive de amici curiae, mesmo que seu encaminhamento fosse no sentido de se debater apenas o reconhecimento da repercussão geral, sem julgamento de mérito. A louvável iniciativa oportunizou às partes se manifestarem de forma plural sobre o reconhecimento da repercussão geral, demonstrando que não há óbice sistêmico para uma integração definitiva entre os ambientes de julgamentos virtuais, conforme aqui se propõe.

[5] A sugestão foi aventada em texto publicado por dois dos autores neste JOTA no início de 2023: “A reconstrução dos plenários do STF: democracia, plenário virtual da repercussão geral e os bons sinais da Emenda Regimental 58/2022”. Disponível em <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/a-reconstrucao-dos-plenarios-do-stf-28012023>.

[6] A sugestão foi aventada em texto publicado por uma das autoras neste JOTA ainda em 2021: “STF: sugestões para o aperfeiçoamento do plenário virtual”. Disponível em <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/elas-no-jota/stf-sugestoes-para-o-aperfeicoamento-do-plenario-virtual-06082021>.

[7] É a sugestão da Prof. Dra. Paula Pessoa Pereira, membro da diretoria da ABPC, em artigo também publicado pelo JOTA em 2020: “Engrenagens do desempenho deliberativo do STF nos julgamentos virtuais: uma proposta de ajustes de peças”. Disponível em <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/elas-no-jota/engrenagens-do-desempenho-deliberativo-do-stf-nos-julgamentos-virtuais-19112020>.

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