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No dia 11 de dezembro deste ano, deverá entrar em vigor a Lei 14.898/2024, que institui as diretrizes nacionais para a Tarifa Social de Água e Esgoto. A entrada em vigor da lei irá impactar significativamente a prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, em especial com relação à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro das concessões.
Em artigo anterior, analisamos como a Lei 14.898 ilustra o desafio de conciliar a capacidade de pagamento das tarifas pelos usuários – isto é, a modicidade tarifária – e a sustentabilidade econômico-financeira dos projetos de saneamento diante das metas de universalização postas pelo Novo Marco do Saneamento Básico.
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Ao mesmo tempo que a lei induz a aplicação de um subsídio cruzado entre as demais categorias de consumidores como forma de garantir a financiabilidade da implementação da Tarifa Social, esse repasse de custos via majoração da tarifa para os demais usuários pode não ser suficiente para o reestabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro (um direito garantido pela própria lei aos prestadores), além de representar um risco à modicidade tarifária em relação aos usuários das demais categorias.
Se para os contratos em vigência as discussões se centram em como implementar esse balanceamento de interesses utilizando-se dos mecanismos previstos nos próprios ajustes, o presente artigo cuida da repercussão da lei para os contratos em formação e que virão no próximo ano, após a entrada em vigor da lei. Como pensar o equilíbrio econômico-financeiro desses contratos, cujas propostas tenham sido realizadas após a entrada em vigor da lei?
Uma visão tradicional do Direito Administrativo possivelmente responderia que os contratos já deveriam incorporar os efeitos da lei em seu equilíbrio econômico-financeiro. Nesse sentido, os estudos de viabilidade deveriam estimar com os melhores dados possíveis o contingente de usuários que poderão ser beneficiados pela Tarifa Social considerando os novos ditames da lei, e os potenciais proponentes deveriam levar em consideração a aplicação da tarifa para todas as unidades consumidoras que atenderem aos requisitos mínimos.
Essa posição, todavia, assume como premissa que a quantidade de usuários beneficiários e os que poderiam potencialmente vir a ser beneficiados seria um dado cognoscível aos licitantes desses projetos, o que faria com que a variação entre os níveis estimados e os efetivamente verificados, uma vez iniciada a concessão, fosse um fator de risco passível de repartição entre concedente e concessionário.
Contudo, considerando a dinâmica prevista na lei para o reconhecimento e cadastramento dos usuários beneficiários – em particular nos artigos 4º e 5º –, ao menos nesse primeiro ano de implementação (ou enquanto o prestador incumbente não encaminhar à Entidade Reguladora Infranacional o cadastro inicial dos usuários beneficiários), a potencial variação entre os patamares estimados de usuários beneficiários da Tarifa Social e os efetivamente verificados futuramente pelo concessionário é melhor caracterizada como uma incerteza (no sentido dado pela literatura econômica a partir da obra de Knight (1921) e não como um mero risco).
Riscos seriam eventos conhecidos em relação aos quais seria possível quantificar a probabilidade de ocorrência do respectivo evento e dos seus efeitos. Por outro lado, no âmbito das incertezas, até é possível saber quais são os eventos possíveis de ocorrer, mas não é possível determinar sua probabilidade de ocorrência e a materialidade dos seus efeitos.
Para esses cenários de incerteza, apenas o reequilíbrio econômico-financeiro dos ajustes, por meio de mecanismos predeterminados, pode vir a ser insuficiente para dar conta de todas as repercussões desse evento de incerteza. A depender da sua magnitude, tais efeitos podem demandar uma verdadeira reabertura das premissas econômico-financeiras do ajuste para garantir a sua viabilidade, como por exemplo o realinhamento das projeções de demanda e, consequentemente, de receitas do projeto concessório.
Contudo, nota-se que os contratos propostos pretendem endereçar os impactos da lei exclusivamente através da aplicação do ITS e dos mecanismos usuais de reequilíbrio econômico-financeiro ou até mesmo de reequilíbrios cautelares (como na recente minuta posta em consulta pública pelo estado do Pará), sem, contudo, abranger a hipótese de uma rediscussão mais ampla das condições do contrato diante da materialização desse evento.
Tal possibilidade deve ser garantida ainda que não haja previsão expressa no contrato como decorrência do conceito de equilíbrio econômico-financeiro extraído do artigo 10 da Lei de Concessões.