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A Procuradoria Geral do Estado de São Paulo publicou recentemente a Resolução PGE 06/2024, regulamentando a transação tributária estadual estabelecida pela Lei 17.843/2023, denominada de “Acordo Paulista”.
Inspirado na transação tributária federal e recebido com muito entusiasmo pelos contribuintes, o Programa previu, além da possibilidade de concessão de descontos em multas, juros e acréscimos legais e o prolongamento da quantidade de parcelas permitidas para pagamento, a possibilidade de novas modalidades de quitação das dívidas: (i) utilização de créditos acumulados e de ressarcimento de ICMS e ICMS-ST; (ii) utilização de precatórios; e (iii) utilização de créditos de produtores rurais, todos eles próprios ou adquiridos de terceiros.
No que tange à utilização de precatórios, há uma primeira desvantagem com relação à transação federal. A regulamentação estadual limitou sua utilização para quitar até 75% dos débitos consolidados após aplicadas as devidas reduções, limitação esta inexistente em âmbito federal. De todo modo, ainda que haja limitação, essa modalidade de quitação apresenta grande vantagem com relação à federal: o preço a ser pago na aquisição de um precatório estadual.
É sabido que o atraso no pagamento dos precatórios pelo Estado de São Paulo criou um grande mercado por trás desses ativos. Os credores, sem perspectiva de receber seus créditos decorrentes de precatórios expedidos, acabam por cedê-los com deságio bastante superior ao que se submete um credor de precatório federal, em razão obviamente do tempo de recebimento.
A possibilidade de aquisição de precatórios para utilização imediata na quitação de dívidas certamente movimentará ainda mais esse mercado, que já começa a sentir suas mudanças. Neste ponto, assim como ocorreu em âmbito federal, é importante que o Estado permita a apresentação da documentação indicada em nome de terceiro, acompanhada de escritura pública de promessa de compra e venda. A exigência da já formalizada cessão do crédito antes de qualquer aceitação por parte da Procuradoria cria um cenário de grande incerteza e insegurança, o que pode inviabilizar muitas das transações.
Já em relação à possibilidade de utilização de créditos acumulados e de ressarcimento de ICMS e ICMS-ST, há o anseio de como se dará sua utilização na prática. Sabendo das dificuldades enfrentadas há anos pelos contribuintes para escoamento de seus créditos, principalmente em relação aos créditos adquiridos de terceiros, esperava-se uma regulamentação mais clara pela PGE. Entretanto, a Resolução publicada apenas remete à sistemática de utilização do crédito que já é prevista no Regulamento do ICMS e que, como sabido, não se mostra tão efetiva.
Outro ponto de grande preocupação é a mensuração do grau de recuperabilidade das dívidas. Se, por um lado, os critérios parecem mais claros e objetivos que os utilizados pelo Governo Federal, por outro, o grau de recuperabilidade passível de conceder descontos aos contribuintes parece muito mais difícil de ser alcançado.
No caso da transação estadual, foram estabelecidos apenas três critérios para definição do grau de recuperabilidade: garantias válidas e líquidas, histórico de pagamentos e tempo de inscrição em dívida ativa. Caso o contribuinte pontue em pelo menos um desses critérios, já passa a ter seus débitos considerados recuperáveis, impossibilitando assim qualquer concessão de desconto. No entanto, nos parece extremamente fácil a pontuação mediante critérios estabelecidos, pois basta que o contribuinte tenha mais de 10% de sua dívida garantida, ou que tenha recolhido nos últimos 5 anos ao menos 10% do saldo atualizado de sua dívida inscrita, ou ainda que tenha ao menos 10% do valor total da dívida inscrita nos últimos cinco anos para ser considerado recuperável.
Ou seja, mais uma vez, os contribuintes que não são contumazes, mas sim que enfrentam dificuldades pontuais para quitar seus tributos em atraso, terão benefícios bastante inferiores, o que não parece justo, apesar de compreensíveis as razões de ser.
De qualquer forma, ainda que não pareçam justos ou animadores os critérios para mensuração da capacidade de pagamento, em clara desvantagem à transação federal, as transações estaduais certamente serão de grande valia aos devedores, pois ainda que os descontos possam ser aplicados a poucos contribuintes, grandes vantagens seguem em jogo: a possibilidade de pagamento em até 120 ou 145 prestações, e de quitação com precatórios próprios ou adquiridos de terceiros com deságio, bem como créditos acumulados de ICMS e de produtor rural.
Sabe-se que ainda é muito cedo para uma avaliação quanto à efetividade da transação tributária estadual, mas o que se pode concluir desde já é que: há sim muitos motivos para comemoração e excelente expectativa tanto por parte dos contribuintes, quanto pelo próprio Governo, na mesma proporção em que há sim muitos motivos para preocupação. É preciso que a administração estadual esteja munida de uma equipe preparada e numerosa, a fim de que possamos estar diante de uma transação que efetivamente funcione, e num prazo de tempo razoável. Todos têm a ganhar com isso: governo, contribuintes com grande passivo estadual e detentores de precatórios ou créditos de ICMS que desejam cedê-los.