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Os requisitos para qualquer cidadão concorrer ao cargo de presidente dos Estados Unidos da América estão no art. II, seção I, inc. 3, da Constituição da Filadélfia: ser cidadão nato, ter 35 anos de idade e 14 anos de residência no país. Além disto, conforme a Emenda Constitucional XXII – adotada em 1951 como reação à eleição de Franklin Roosevelt para quatro mandatos – não pode concorrer quem já exerceu o cargo por dois termos, consecutivos ou não. E é só isso.
Não há lei de inelegibilidade ou algo como a nossa controversa “lei da ficha limpa”. Tecnicamente, não há na Constituição ou em leis federais qualquer dispositivo que vede a candidatura de um condenado em cumprimento (provisório ou definitivo) de pena. Já houve, inclusive, um precedente na eleição disputada em 1920. O candidato do Partido Socialista, Eugene Debs, disputou a presidência dentro de um presídio – e ficou em terceiro lugar, amealhando cerca de 1 milhão de votos dentre 26 milhões de eleitores.
É bem verdade que a Décima Quarta Emenda, na seção 3, proíbe de exercer cargos públicos aqueles que, tendo jurado a Constituição, se engajaram em “insurreição ou rebelião”. A norma foi editada no contexto do pós-Guerra Civil, para banir da vida pública os líderes dos Confederados.
Essa norma constitucional poderia, em tese, incidir sobre Trump se ele for condenado no caso de tentativa de subversão dos resultados eleitorais do último pleito presidencial, processo que está em curso na Justiça Federal de Washington, sem data à vista para ser concluído. Ainda assim, certamente a questão seria submetida à Suprema Corte e, diante da atual composição, dificilmente poderia haver uma decisão afastando Trump do exercício de um eventual segundo mandato.
A Corte já sinalizou uma rejeição à tese quando apreciou neste ano o indeferimento do registro da candidatura do republicano pela autoridade eleitoral do Colorado. Embora admitindo que a cláusula da Décima Quarta Emenda pode ser aplicada aos dias atuais (e não apenas aos que promoveram a tentativa de secessão), a maioria dos juízes entendeu que somente o Congresso poderia aplicar a pena de inelegibilidade (Trump v. Anderson). As juízas Barrett, Kagan, Sotomayor e Jackson ficaram vencidas neste tópico. A primeira entendeu que a Corte não deveria se pronunciar sobre a questão, enquanto as três últimas defenderam que não se pode dar exclusividade ao Congresso na decretação de inelegibilidade.
Fato é que a condenação de Trump por fraudes contábeis para encobrir a compra do silêncio de Stormy Daniels dificilmente resultará em prisão efetiva. A pena prevista para esse tipo penal varia de um ano e quatro meses a quatro anos de prisão. Tendo em conta a sua idade e ausência de antecedentes criminais, a pena de prisão pode ser dispensada ou substituída por outro tipo de sanção diverso da restrição de liberdade.
Além do processo por tentativa de subverter as eleições, Trump ainda está sendo processado criminalmente na Justiça Estadual da Geórgia, acusado de intimidar servidores estaduais que trabalhavam na apuração das eleições e, também, na Justiça Federal da Flórida, pela suposta conduta de apropriação indevida de documentos do governo americano.
Se uma disputa de eleições presidenciais com um candidato preso não é uma impossibilidade nos dias que correm, isto não é tão improvável em outras instâncias da política americana. Pois há alguns casos de políticos estaduais que foram eleitos mesmo condenados ou cumprindo pena.
O mais recente deles ocorreu na Assembleia Legislativa da Virgínia, em 2015. O deputado estadual e advogado Joseph Morrissey, de 57 anos, foi acusado de manter relações sexuais com a recepcionista de 17 anos de seu escritório de advocacia. Em virtude do escândalo, renunciou e fez acordo (plea bargain) com a promotoria para cumprir pena de um ano, com seis meses de condicional.
Porém, apesar do acordo, o político sempre negou as acusações (alegando que a vítima lhe dissera ter 22 anos) e, apenas alguns meses mais tarde, tendo sido expulso do Partido Democrata, concorreu outra vez ao Legislativo como candidato independente por seu distrito eleitoral e derrotou os dois adversários dos partidos tradicionais. Em razão do ampliado conceito de imunidade parlamentar no direito norte-americano, Morrisey saía durante o dia para as sessões legislativas e dormia na prisão à noite.
Mas, por enquanto, dificilmente veremos um presidente dos EUA dando expediente durante o dia na Casa Branca e se retirando ao escurecer para dormir em uma cadeia em Washington D.C.