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O presidente da Pontifícia Academia para a Vida define a escolha desta quinta-feira (11) da instituição da União Europeia de “um atraso cultural”, indicativo de “uma concepção individualista da vida”, que defende o ‘eu’, mas não o ‘nós’.
Francesca Sabatinelli – Vatican News
Que o aborto seja incluído na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. A votação desta quinta-feira (11) no Parlamento Europeu – na esteira do que já havia sido estabelecido pela França, o primeiro país da União a inscrever o direito à interrupção da gravidez na Constituição Francesa – divide os 27, o que, levando em conta que esse direito exige unanimidade para ser incluído na Carta, torna a ser uma votação simbólica.
Contrariedade e tristeza foram expressas imediatamente após a votação pela Comece, a Comissão das Conferências Episcopais da Comunidade Europeia, segundo a qual o direito fundamental é a vida e não o aborto, que a nega quando é mais vulnerável. Um conceito retomado e defendido por dom Vincenzo Paglia, presidente da Pontifícia Academia para a Vida, para quem a escolha do Parlamento Europeu “contrasta” com o respeito aos direitos dos mais fracos, como o nascituro.
Dom Paglia, qual é a sua opinião sobre essa votação do Parlamento Europeu?
Eu a considero uma escolha totalmente ideológica, no sentido negativo do termo, porque imagine se não devemos levar as mulheres em consideração, ajudá-las, apoiá-las, também porque muitas delas que abortam o fazem por desespero. O problema é: a ausência total do direito do nascituro. Em minha opinião, isso é muito sério do ponto de vista cultural, além de social. Nesse sentido, parece-me uma escolha que vai para trás, não para frente, e vai contra o respeito por todos os direitos, até mesmo dos mais fracos, e nesse caso o feto é mais fraco, não pode falar, não pode reivindicar nada, e é lógico, muito fácil, fazer valer os direitos do mais forte e esquecer o mais fraco. É uma escolha errada reivindicar um direito somente de uma parte, não de ambas.
Então, que tipo de mentalidade o resultado dessa votação do Parlamento Europeu está delineando?
Ele delineia uma mentalidade que, em minha opinião, é altamente individualista e não leva em conta a realidade da vida. Não vamos nos esquecer de que, quando uma mulher está grávida, há duas realidades. Nesse sentido, o renascimento total dos direitos individuais, às custas também dos deveres uns para com os outros, nos leva a uma triste deriva, a deriva de que cada um pode ser juiz de si mesmo. E esse cada um pode ser o indivíduo, pode ser um grupo, uma nação. E, nesse sentido, há uma embriaguez do individualismo. Repito, isso também implica em uma proximidade total com as mulheres que engravidam. Há uma necessidade de justiça efetiva para ajudar as mulheres a defender sua dignidade, seu direito ao trabalho, seu direito de se expressar plenamente como cada pessoa humana.
Então, como denunciam os bispos europeus, é a União Europeia que impõe uma certa ideologia?
É claro, mas não há dúvida. Além disso, gostaria de salientar que a oposição ao aborto não é apenas uma questão católica. Tenho muitos amigos, por exemplo, Angelo Vescovi, presidente do Comitê Italiano de Bioética, que é contra o aborto, apesar de não ser crente nem católico. Aqui o problema é muito simples: a pessoa que foi gerada é uma vida ou não? Se for uma vida, com que direito eu a excluo ou elimino? Portanto, entendo que pode haver conflitos e, às vezes, isso faz parte da dialética geral. Mas desconsiderar totalmente o direito daquele que está para nascer em favor dos direitos de outro, especialmente se ele não puder decidir nada, parece-me claramente um retrocesso cultural. Não tenho dúvidas de que isso deve ser um retrocesso. E sobre isso também acho interessante a última declaração da Doutrina da Fé, de que a dignidade infinita pertence a todos, sem excluir ninguém. É por isso que a Igreja deve defender a vida: somos contra a pena de morte, contra a guerra, contra o aborto, contra a injustiça, contra a ausência de direitos no trabalho, a ausência da defesa da vida mesmo para aqueles que trabalham em condições terríveis. É isso que devemos absolutamente promover: a defesa da vida em todos os aspectos, começando pela dos mais fracos.
Muito provavelmente essa votação não terá consequências porque essa medida teria de ser ratificada por unanimidade pelos 27 países. Isso não será possível porque vários países já expressaram sua oposição. O fato é que isso é um sinal…
Mas é claro, e isso é um sinal ruim. O problema agora não é imediatamente o legislativo, porque acho que será difícil aprová-lo. A questão é cultural e é muito profunda, justamente porque acredito que a acentuação exaltada e exagerada dos direitos individuais nos faz esquecer que estamos todos interconectados. A questão é cultural e é muito profunda, justamente porque acredito que a acentuação exaltada e exagerada dos direitos individuais nos faz esquecer que estamos todos interconectados, todos ligados. O mistério da maternidade e do nascimento é um dos mistérios que qualifica o próprio sentido da vida e da humanidade, ou seja, que somos plurais desde o início: se a mulher decide por si mesma sem levar nada em conta, é um vulnus para essa concepção de “nós” que é desde o início. Nesse sentido, também devemos redescobrir a corresponsabilidade pela vida que está nascendo. Quem tem o direito de suprimi-la? É por isso que acredito que esse é um problema cultural muito mais profundo do que uma superficialidade, eu o chamaria de embriaguez do direito individual. Volto a dizer que devemos ter a vida das mulheres em alta conta, em altíssima conta. Madre Teresa deu um asilo dizendo às mulheres grávidas: dêem à luz, eu as levarei, porque muitas mulheres abortam porque têm problemas, talvez econômicos ou até mesmo psicológicos ou de outra natureza, porque estão sozinhas e não são ajudadas. É por isso que acredito que, em comparação com uma cultura que continua a exaltar o “eu”, devemos nos empenhar em uma cultura do “nós”. Porque o “nós” é a substância do ser humano, é a substância da solidariedade, da fraternidade e, portanto, também da justiça. Em suma, esse voto vai muito além de uma simples escolha política. Ele aponta para uma concepção individualista da vida que não é o que todos nós vemos e todos percebemos, aquele “nós” que deve ser valorizado desde o início.
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