Quando se pode dizer que há oportunismo contratual em concessões?



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Em dissertação de mestrado defendida em janeiro do presente ano na FGV Direito Rio, Gianne Lima explora a ideia de oportunismo contratual em concessões nos setores de infraestrutura. No trabalho, orientado pelo professor Eduardo Jordão e já disponível para acesso público, a autora caracteriza o oportunismo contratual como uma espécie de adaptação comportamental de uma das partes em função da mudança de incentivos característica dos acordos de longo prazo, como contratos de concessão.

A autora percebe que em relação aos incentivos para ação da agência reguladora, há dois momentos contratuais. No primeiro momento, o concessionário tem a obrigação de realizar investimentos relevantes para melhorar ou implantar infraestrutura para prestação dos serviços. Nesse momento, a agência e o poder concedente, interessados em obter os benefícios econômicos e políticos da realização pelo concessionário dos investimentos, em tese teriam incentivos para cumprir suas obrigações contratuais adequadamente.

Por outro lado, após a realização dos investimentos pelo concessionário, quando se inicia o momento durante o qual é necessário preservar os direitos do concessionário para que ele consiga a remuneração do seu investimento, momento em que a agência reguladora deve realizar todos os reajustes e reequilíbrios do contrato para preservar a capacidade do concessionário de remunerar os seus investimentos, nesse momento a agência não teria incentivos para cumprir à risca suas obrigações.

Baseada nessa construção teórica, a autora chega a uma regra de toque muito simples para avaliar a adequação do funcionamento de uma agência reguladora: a agência reguladora desempenhará adequadamente o seu papel se antes e durante a fase de investimentos do contrato de concessão se preocupar em proteger o poder concedente; e, se, na fase após o investimento, se preocupar em proteger o concessionário. Um resumo genial, pela simplicidade, precisão e concisão, do que deveria ser a mola mestra da atividade de uma agência reguladora.

Apesar da existência do oportunismo contratual ser algo intuitivo – particularmente em um ambiente em que é bastante comum, por exemplo, a supressão de reajuste de tarifas contra a inflação e as tentativas na esfera administrativa de postergar, evitar e reduzir o valor de reequilíbrios devidos aos concessionários – a autora enfrentou desafios até mesmo na apreensão teórica do que seria oportunismo contratual. Não há uma conceituação do tema na doutrina nem no Brasil, nem no âmbito internacional. Os conceitos mais próximos que a autora encontrou foram os de “demagogia regulatória”, utilizado pelo professor Marçal Justen Filho, e o de populismo contratual, que tenho utilizado nos cursos que ministrei nos últimos anos.

Além da construção teórica do conceito de oportunismo contratual, a dissertação analisa um caso real para verificar a sua eventual ocorrência concreta: a atuação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) no processo de reequilíbrio dos aeroportos concedidos em virtude dos impactos da pandemia de Covid-19. Para isso, compara a atuação da Anac em relação a dois conjuntos de aeroportos durante a pandemia, os aeroportos da 6a rodada, que ainda não tinham sido concedidos, com o portfólio de aeroportos já concedidos pela Anac.

A premissa da autora é a de que a Anac teria incentivos para tratar de forma mais benéfica os aeroportos ainda não concedidos do que os já concedidos. A eventual assimetria que ela viesse a detectar no tratamento desses dois conjuntos de aeroportos pela Anac em relação à pandemia poderia confirmar a ocorrência de oportunismo contratual no caso.

Mais especificamente, Gianne verificou se a Anac atuou de forma simétrica (i) na atualização dos estudos de demanda utilizados para a realização da concessão dos aeroportos da 6a rodada e (ii) no reequilíbrio pela perda de demanda dos aeroportos concedidos.

Essa comparação foi possível porque, quando surgiu a pandemia, estavam prontos os estudos de demanda a serem utilizados para o cálculo do valor do pagamento mínimo pela outorga para o leilão dos aeroportos da 6a rodada. O leilão foi adiado e novos estudos de demanda foram feitos considerando os impactos da pandemia sobre a curva de demanda.

O modo como a Anac considerou esses impactos no caso da 6a rodada forneceria, portanto, um parâmetro de comparação para se verificar se a agência foi ou não oportunista. Na lógica adotada por Lima, a Anac poderia ser considerada oportunista se tratasse pior os contratos de concessão celebrados utilizando metodologia que levasse a reequilíbrios com base em impactos menores que os que considerou nos estudos para a licitação da 6a rodada.

Após a sua análise, a autora chegou à conclusão de que não há elementos neste caso para afirmar que houve oportunismo contratual da Anac. A conclusão revela elogiável honestidade intelectual, por admitir ao leitor a não comprovação da premissa que orientou o estudo.

Acho, contudo, que a análise realizada por ela sobre o caso concreto requereria aperfeiçoamentos metodológicos. Não posso afirmar que os resultados da análise seriam necessariamente outros. Seria realmente necessário realizar a nova análise para verificar isso, o que não é o objeto do presente artigo.

Mas é preciso notar que a diferença central entre o tratamento pela Anac do portfólio de contratos de concessão e os novos aeroportos foi basicamente a seguinte:

no caso dos aeroportos a serem contratados, a Anac considerou os impactos da pandemia pelos 30 anos de contrato de concessão;
no caso dos aeroportos concedidos, a Anac resolveu avaliar ano a ano o impacto do reequilíbrio e decidir a cada ano se o reequilíbrio era devido.

Vale chamar a atenção para o fato de que a Procuradoria-Geral da Anac, no seu parecer sobre o reequilíbrio dos contratos de concessão de aeroportos em decorrência dos impactos da pandemia, reservou-se a prerrogativa de verificar ano a ano, por ocasião da realização anual dos reequilíbrios, se os efeitos da pandemia (que é considerada evento imprevisível e de impactos extraordinários) tinham se tornado “previsíveis e de impactos ordinários”. Este procedimento simplesmente não é permitido pelo nosso sistema jurídico.

Os eventos podem ser classificados em previsíveis ou imprevisíveis, com impactos ordinários ou extraordinários. O parâmetro para traçar essa linha deveria ser a probabilidade de ocorrência desses eventos e os efeitos que se esperava que eles viessem a produzir quando foram realizadas as propostas na licitação do contrato de concessão. Esse parâmetro, portanto, não deveria variar ao longo do contrato, porque foi com base na linha divisória entre eles, estabelecida no momento da licitação, que os participantes da licitação precificaram as suas propostas.

Faz menos sentido ainda a ideia de que um evento já ocorrido e classificado como imprevisível e de impactos extraordinários tenha seus efeitos reclassificados como previsíveis e de impactos ordinários. Chega a ter um componente quase surreal: depois que um evento imprevisível e de impacto extraordinário aconteceu, a Procuradoria da agência se reserva o direito de dizer futuramente que ele “deixou de ser” imprevisível (pois, afinal, ele já ocorreu, e, então, claro, já se tornou previsível), e não é mais extraordinário, porque já nos preparamos para conviver com o custo ou a perda de receita que ele gerará ao longo dos anos.

Evidentemente, uma vez ocorrido o evento e classificado como imprevisível e de impactos extraordinários, todos os seus efeitos são risco do poder concedente e, portanto, o reequilíbrio deve abranger todos esses efeitos mesmo que eles se produzam ao longo de vários anos. Não é adequada a ideia que um evento já ocorrido, reconhecido como imprevisível, seja transmutado posteriormente como algo previsível. Isso porque, como já falei acima, a precificação dessas ocorrências e o parâmetro para mensurar os seus impactos se estabiliza no momento em que se realizou a proposta na licitação.

Assim, a prerrogativa que a Procuradoria da Anac se atribuiu precisava ser analisada no trabalho de Gianne e verificados quais os impactos sobre o valor esperado do reequilíbrio pelos concessionários. Isso porque o montante do reequilíbrio esperado é impactado pela incerteza criada pela prerrogativa autoatribuída da Procuradoria da Anac de verificar ano a ano se os efeitos da pandemia continuam a ser considerados efeitos de evento imprevisível e de impactos extraordinários.

Daí ser algo muito diferente reconhecer no presente todos os efeitos de um desequilíbrio cujos impactos se alongam por vários anos – coisa que, aliás, é exigido pelas regras dos contratos de concessão de aeroportos – de reconhecer e pagar ano a ano os desequilíbrios, como o fez a Anac.

Além disso, é preciso reconhecer que, ao comparar o tratamento dado pela Anac aos estudos para a realização da licitação dos contratos de concessão da 6a rodada com o tratamento dos contratos já celebrados, é preciso considerar que se trata de situações assimétricas. No caso da 6ª rodada, qualquer benefício dado no tratamento do estudo seria em tese corrigido pela pressão competitiva na licitação. No caso dos contratos já celebrados, não havia esse elemento para evitar benefícios indevidos.

Por essa razão, parece-me que uma verificação rigorosa a respeito da ocorrência do oportunismo no caso da atuação da Anac em relação aos reequilíbrios pelos impactos da pandemia nos contratos de concessão em curso deveria se focar (a) na análise das regras sobre reequilíbrio dos contratos e, sobretudo, (b) na comparação entre o reequilíbrio pela pandemia e os demais reequilíbrios já realizados pela Anac.

Particularmente, acho que seria necessário verificar:

se o “parcelamento” do reconhecimento do desequilíbrio pelo impacto da pandemia é compatível com as regras previstas no contrato de concessão;
se essa prática foi adotada em outros reequilíbrios realizados pela própria Anac; e
se a Anac já havia criado e se já aplicou antes essa novidade de poder mudar o status de um mesmo evento de imprevisível e de impactos extraordinário para previsível e de impactos ordinários. Enfim, é preciso aperfeiçoar a análise realizada pela autora.

De qualquer modo, o trabalho de Gianne Lima tem o enorme mérito de trazer novo tema, até então desconhecido da teoria jurídica, que amplia a noção de descumprimento contratual para além das fronteiras tradicionais deste conceito, para abranger condutas que são claramente antiéticas, mas que não necessariamente são consideradas antijurídicas.

Nesse sentido, pode-se afirmar que esse tipo de trabalho doutrinário e os seus desdobramentos promovem a honestidade no cumprimento dos contratos. Identifico, por isso, por trás do trabalho da Gianne a utopia de um ambiente negocial no qual as partes se comportam de forma honesta no mundo de infraestrutura.

Aliás, como diria Rutger Bregman, a função desse tipo de utopia é abrir as janelas da alma, é permitir que se enxergue as mazelas do status quo. É curar as cegueiras decorrentes da acomodação, ou de ter assistido os insucessos próprios ou alheios em mudar esse contexto. E, assim, levantar as expectativas do que podemos atingir em sociedade.

O trabalho de Gianne Lima nos permite contemplar esse sonho e tem o mérito de ter iniciado uma construção jurídica que creio ter tudo para prosperar. Espero que ela tenha a persistência e a paciência para desenvolvê-la ao longo da sua promissora carreira acadêmica e profissional.

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